Quem
lembra do Genésio Gambá? Certamente muito poucas pessoas, porque
ele teve seu apogeu pelos idos do final de 1940 para início de 50, em plena guerra, na escuridão de uma cidade que somente fazia dormir.
Genésio era filho de Maria Chanda e pai
nunca encontrado, embora Laurentino
de vez em quando aparecesse em casa passando a mão na sua cabeça com ar de cumplicidade. Assim foi sua infância, na beira do rio Grande, palhoça de pouca palha, luz de pouca luz, comida de muita sorte.
Quando chuva batia forte, a água entrava
pela porta adentro molhando o pouco
que tinha, apagando o fogo das poucas achas retiradas de logo ali, na barranca do rio.
Já taludo, sem escola mas com sabedoria do
mato, certa tarde achou por bem subir
no Cambucá para espreitar melhor a região. Coisa da idade. Curiosidade com pouco limite. Já bem lá em cima, dando pra ver a casa da Bézinha, o telhado da escola em reforma há mais de cinco anos, o mato sem fim, descuidou-se e despencou-se. Ficou inerte no chão sabe-se lá por quanto tempo. Pelo menos até o dia seguinte, pois acordou molhado que não era de chuva.
Tratado por Maria Chanda, logo se pôs de pé com vigor e esquisitice, daquelas
que nunca teve. Das brabas.
Mais algum tempo e Maria Chanda respondeu
chamado do além, bateu com as
dez. Ficou Genésio triste, caído mesmo, disposto a mudar de lugar, ir mais pra cidade, ver mais gente. O impulso de fazer alguma coisa começou a ocupar sua cabeça, não demorando muito para juntar uma camisa já com buraco, uma calça também com o mesmo sintoma, e nada mais. Se foi para a cidade, encontrando logo de cara, bem perto da Santa Casa, uma casa vazia, com a porta semi aberta e os cômodos completamente desnudos. Lugar ideal para se instalar. Ficar. Assim fez Genésio começando uma nova sina de sua vida que iria torna-lo notícia por toda a região.
Depois do tombo Genésio passou a ter
arrepios quando entrava n'água. O rio Grande
passou a ser um martírio somente olhá-lo, quanto mais ficar dentro dele, como era de seu costume. Era um arrupio com tremedeira que somente amainava com algum tempo de secura. Esse provavelmente foi o motivo de querer mudar daquele lugar. Ir para onde a água não fosse seu algoz.
Algum tempo
depois de estar instalado na rua Conceição, certa noite sentiu uma
vontade
incontrolável de ir até sua antiga palhoça. Era noite avançada, embora iluminada por uma cheia de luz azulada. Bonita de se ver.
Já na barranca do rio, bem perto do Cambucá,
Genésio sentou no costado da raiz,
encostou a cabeça no gigante e adormeceu quase que instantaneamente. Acordou com sol quente, corpo doído, boca seca, fome de respeito. Deu as costas para o rio e se foi para seu casebre tratar da carcaça.
Ao passar pelo chafariz notou logo que as
crianças que faziam roda de pião se
debandaram em tresloucada carreira. O mesmo na encruzilhada da Jordão Homem da Costa com a Conceição, perto de sua casa.
Lá, seu Manequinho estava a sua espera. Se foi para a prisão local. Trancado entre
grades aguardou no canto resposta do sucedido.
Genésio na noite anterior tinha se
transformado em lobisomem, sendo encontrado
vagando pelos arredores da caixa d'água por dois notívagos embriagados que seguiam para suas casas após merecida esbórnia.
Chamados para confirmar a notícia espalhada,
tudo foi negado, ficando para sempre,
além da pecha de não tomar banho, a de se transformar em lobisomem pelos lados do rio Grande, em noite de lua cheia |
quinta-feira, 16 de outubro de 2014
Memórias do Genésio Gambá
Ubatuba, sim, sim, sim...
Por Eduardo Antonio de Souza Neto -
Original do site :
http://www.ubaweb.com/ubaweb/n18/18_art3.html#ubatuba
"Todavia, tudo quanto naquele reino santo a minha mente pôde entesourar será, agora, objeto de meu canto."
(Canto I, 10 - Paraíso - A Divina Comédia - Dante Alighieri)
|
Quanto
à nossa velha Ubatuba, meu caro Aládio, comparo-a a Helena, prisioneira
dos troianos dentro de muralhas inexpugnáveis, e às vezes me sinto como
se fora um insignificante soldado aqueu cansado, depois de tantos anos
de duras e sangrentas batalhas, que em determinado momento já não sabe
mais porque e por quem esta lutando e se vale mesmo a pena lutar. Fica
em dúvidas se há mesmo uma Helena prisioneira a ser resgatada, se tudo
não passa de um sonho e, quem sabe se, existindo Helena, queira ela
realmente ser salva das mãos de seus novos senhores. Talvez Helena seja
apenas um símbolo que inventamos, uma bandeira que elegemos para não
sucumbirmos, para não nos insularmos como ascetas ou internarmo-nos de
vez num mosteiro, tamanho é o tédio e os absurdos de hoje em dia. Será
que a Ubatuba de que sentimos saudade existiu mesmo? Não estaria a
memória a nos pregar uma peça? Será que essa Ubatuba foi tão esplêndida
assim, para que nos engajemos na tentativa de ao menos resgatar o que
nela entendemos ter havido de bom e que hoje, com raríssimas exceções,
nem sequer vestígios existem mais.
BAGRE DE GARRAFÃO........
Por. Fatima Aparecida Carlos de Souza
Leovegildo Dias
Vieira era donatário de terras no bairro do Itaguá. Conhecido como
Vivi, possuía muitos empregados que trabalhavam em seu alambique.
Não era difícil encontrar as carroças e
carros de bois carregados de garrafões de vidro para serem lavados no
rio Acaraú, no portinho do Bastião Rita. Com muitos desses vasilhames,
acontecia de se quebrarem ou sofrer um trincamento. Quando isso
acontecia, eram deixados de lado nas barranceiras do rio.
MIGUEL AGEU 100% UBATUBENSE....
Caiçara da gema, o saudoso Miguel Ageu comandou durante muitos anos inúmeros blocos de rua, vivenciou uma época de ouro do nosso carnaval, foi sem duvida um grande estadista do Carnaval Ubatubense...Miguel Argeu, que todos os anos colocava na rua seu bloco, com os componentes garbosamente vestidos de coloridas fantasias de lamê, alegrando a cidade inteira com inesquecíveis marchinhas tais como: Me dá um dinheiro ai / Estrela Dalva / Alalaô... / Amélia... que são ainda, cantadas até hoje...
No carnaval que passou estrelavam: Zéca Pão, Biscoito, Veiga, Miguel Argeu...
Aládio Teixeira Leite Filho
articulista@ubaweb.com
Muitas
histórias, algumas engraçadas, outras recheadas de um lirismo comovente
e alguns raríssimos fatos permeados de algumas pitadas de tristeza,
como é normal em qualquer lugar, formavam o cotidiano de nossa chuvosa,
madorrenta e feliz cidade, nos tempos inocentes em que vivíamos aqui,
quase que totalmente isolados de outras terras, não nos valessem
ligações marítimas com locais como Santos, Paraty...
Desta forma, quase que todas as coisas
dependiam de soluções caseiras, fosse na saúde, economia, lazer... No
que se refere à área da saúde o mais comum era recorrer-se a benzedores e
fazedores de remédios a base de ervas, que na época proliferavam e
atuavam quase que em todos os bairros e mesmo na parte considerada mais
central de nossa minúscula Ubatuba.
MEMÓRIAS PRECIOSAS
Dona Gertrudes: caiçara de prosa maravilhosa! (Arquivo JRS) |
“Você está com doze anos? Então deve ter
nascido em 1919, certo? Vinte e sete de dezembro, né? Pronto! Agora você já tem
registro e pode viajar para Santos!”. Foi assim que eu imaginei o
tabelião
resolvendo a questão de Gertrudes Francisca do Nascimento, caiçara da
Praia das
Toninhas, filha de Cristóvão Cabral Barbosa e de Benedita Francisca do
Nascimento. “Nesse tempo eu ainda era Nascimento. Não trazia o nome da
família
do pai porque, naquela época, os filhos só eram registrados tendo o nome
da descendência
materna. O nome que tenho hoje – Gertrudes Francisca Lopes – vem de
quando eu
me casei com Benedito Lopes”. Neste dia (15/10/2014) passei uma tarde
inesquecível, numa prosa maravilhosa com Dona Gertrudes e outras pessoas
da nossa terra, da nossa cultura. Desde já agradeço ao Rogério
Estevenel pela articulação do encontro. Valeu mesmo!
Assinar:
Postagens (Atom)