quarta-feira, 20 de agosto de 2008

LENDA: Boi das Conchas 2

A Lenda do “Boi de Conchas” II
-Ratambufe!-Isso mesmo, você vai se chamar Ratambufe!
Esse mugido tá parecendo o som de um ratambufe. Você nasceu no dia de São Pedro Pescador, não é? Vou leva-lo para conhecer o mar! Você vai ver que beleza que é o mar. Está ouvindo Ratambufe?O recém nascido bezerro fitava a promessa do Velho Cipriano.Ratambufe era um boizinho quase que inteiramente branco.Cipriano era um tropeiro do Bairro Alto de São Luiz do Paraitinga que comercializava em Ubatuba. Descia e subia a serra semanalmente, trazendo e levando mercadorias.Ratambufe foi crescendo e ouvindo as promessas de seu dono que iria lhe mostrar o mar. O que seria o mar? O que seria as gaivotas, as conchas, os peixes, os guaroçás,... que Cipriano sempre falava? Ratambufe cresceu ouvindo falar do mar...-É amanhã, Ratambufe! Amanhã você vai conhecer o mar! Essa história de MAR era conversa prá boi dormir; Cipriano, como bom comerciante que era, levaria o boi para o matadouro. E no fundo o boi sentia sua morte num matadouro.A descida da serra foi tranqüila, por entre grotas e cachoeiras, sob as sombras de brecuíbas e manacás, ao som de arapongas e tangarás,... O animal, fascinado e ansioso fazia a tropa acelerar os passos.-Caaaalma Ratambufe, está chegando! Alertava Cipriano....Cipriano se arrependeu, e se arrependeu muito...-Olha, Malvina! Eu vi, eu juro que vi!-Você está ficando doido, Lindolfo! Onde já se viu um boi sair de dentro do mar!?-Você sabe que eu não bebo, Malvina! Eu vi! Eu estava tocando minha viola na beira da praia, quando apareceu aquele vulto branco. O bicho veio ao som da minha viola, veio vindo, veio vindo e ficou diante de meus olhos, no lagamá. Eu vi! O bicho era todinho coberto com conchas. Brilhava com a florescência da ardentia. -Olha Lindolfo. Não dá para acreditar. Não dá!!!-Puxe um pouco pela memória, Malvina! Você lembra daquele boi branco que o Cipriano trouxe do Bairro Alto? Você lembra o que aconteceu com o boi?-Ouvi falar que o boi entrou no mar e morreu afogado!-Foi justamente isso Malvina: O boi vinha para o matadouro, mas foi direto para a praia; ao chegar perto do mar o boi travou as pernas e ficou olhando para o horizonte do mar, parecia que estava ouvindo um som, algum canto diferente, de repente o boi caminhou e entrou no mar, e o que se sabe é que o bicho nunca mais apareceu. Dizia o Cipriano que ele vivia falando para o boi da beleza que era o mar... Quando o bicho viu o mar de perto e sentiu a maresia, ficou alucinado, deu uma loucura que o bicho desapareceu mar adentro; nunca mais apareceu. Pescadores diziam que era o canto das Sereias. O Boi foi atraído pelo canto das Sereias!!!-É Malvina, isso é fato comprovado!!!O BOI DE CONCHAS foi uma aparição aos olhos de vovô Lindolfo e a muitos outros pescadores. Para vovô Lindolfo, o boi aparecia toda vez que ele dedilhava sua viola aos pés da amendoeira da praia do Cruzeiro.Fica aí registrado, a LENDA DO BOI DE CONCHAS, que vovô me contava quando eu era criança. Acredite ou não, o boi aparecerá, saindo do mar toda vez que se fizer ouvir o som de viola, pandeiro, ratambufe,...

Júlio César MendesUbatuba 13/01/2002

*Ratambufe: Instrumento tipicamente Ubatubano, inventado pelo caiçara Domingos Anagro, nos carnavais da década de quarenta. Instrumento meio de percussão, meio de fricção; constituído de um pau de madeira roliça, onde na parte superior prendem-se chocalhos de conchas. Amarrado ao pau, estica-se um arame que passava pela boca de uma lata pregada ao mesmo pau. O som era produzido por um reco-reco de bambu que era esfregado no arame. Esse instrumento produz um som parecendo berro de bezerro com rolar de conchas em beira de lagamá.