PARA QUEM CHEGOU AGORA : Estou publicando em partes na integra o Livro " ubatuba, espaço, memória e cultura", o qual teve seu lançamento em 2005, e foi escrito a quatro mãos , sendo escritores : Juan Droguett (Professor da USP) e Jorge Otavio Fonseca (meu irmão). O livro conta em detalhes nunca antes visto a historia de minha querida cidade Ubatuba. Inicio aqui o capitulo 2 do livro. Próxima atualização 15 de setembro próximo...
2. ANCORA NOS PRINCIPAIS ATRATIVOS CULTURAIS DA CIDADE
Uma âncora é sinal de suspensão de uma trajetória ou travessia, este é o significado mais próximo do estado necessário para apreciar os chamados atrativos culturais de Ubatuba, como de qualquer outro destino turístico. Os atrativos naturais são uma dádiva da natureza sempre em movimento, daí o caráter itinerante da nossa viagem pelas praias da região escolhida. Em contrapartida, os atrativos culturais são frutos da intervenção humana ao longo do tempo, tudo aquilo que é da ordem da história e da cultura de um povo.
Portanto, um atrativo cultural se define pela capacidade humana de interferir no espaço natural. Américo Pellegrini define como elementos cruciais do patrimônio cultural: conjuntos e lugares. Conjuntos são agrupamentos de construções, isoladas ou reunidas, cuja arquitetura, unidade e integração na paisagem, lhes proporcionam um valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte e das ciências. Lugares são obras do homem e da natureza, assim como zonas que incluem sítios arqueológicos que também possuem um valor excepcional do ponto de vista: histórico, estético, etnológico ou antropológico (Pellegrini, 1999: 98).
Certamente, estas definições de Pellegrini vêm de encontro com os lugares que escolhemos para ilustrar o patrimônio cultural de Ubatuba. Começando pela Igreja Matriz, marco de entrada da colonização portuguesa na aldeia de Iperoig e terminando no Corcovado, ponto de encontro entre a terra e o céu de Ubatuba, lugar excepcionalmente destacado por guardar o passado mítico de seus primeiros habitantes e as lendas que povoam o imaginário cultural da região. Os 8 atrativos culturais de Ubatuba selecionados para mostrar a sua relação com a história e a cultura da cidade serão: a Igreja Matriz, a Cadeia Velha, Ruínas da Lagoinha, a Casa da Farinha, o Aquário, o Projeto TAMAR e o Casarão do Porto – FUNDART e o Corcovado, entre a terra e o céu de Ubatuba.
1.
A IGREJA MATRIZ
Localização
A Igreja Matriz encontra-se na praça situada bem no centro da cidade de Ubatuba com as ruas nas laterais: Dona Maria Alves e Condessa de Vimieiro, atrás a Rua Jordão Homem da Costa e à frente a Rua Dr. Félix Guisard.
Horário de Funcionamento
Missas durante a semana e sábado: às 7 h e 19:30 h.
Domingos: 7, 9, 18 e 19:30 h.
Escritório Paroquial: durante a semana das 13:30 às 17:30 h.
A Igreja Matriz de Ubatuba é um prédio histórico capaz de satisfazer o interesse do público pelo passado. A primeira construção da Igreja Matriz foi dedicada a Nossa Senhora da Conceição, segundo nos relata Washington de Oliveira, no seu livro Ubatuba – Documentário (1977), antes das ruas serem asfaltadas podiam ser vistas a olho nu, as lajens que serviam de alicerces à Igreja16. Nas escavações feitas no lugar, acharam-se ossadas humanas, cadáveres que foram sepultados de acordo com a tradição eclesial, provavelmente sejam corpos pertencentes a clérigos ou nobres da época a quem correspondia tal privilégio.
O primeiro templo devia ser pequeno e em mal estado – observa o historiador -, por essa razão, providenciou-se a construção de uma nova Matriz que teve início na segunda metade do século XVIII. Por decisão da Câmara de São Sebastião, da então Província de São Paulo, que legislava a respeito da Vila de Ubatuba, determinou-se a construção de uma nova Igreja Matriz em vistas de que a existente estava em estado “deplorável”, e assim foram fixadas contribuições para este nobre propósito.
Muitos foram os empecilhos após a declaração da Câmara de São Sebastião (1798), que assombraram o projeto da Igreja Matriz. Problemas nos alicerces, madeiras corrompidas e irregularidades nas paredes constituíam um vexame para o Império que na Matriz de Ubatuba visualizava um emblema de seu poder temporário.
O dilatamento da burocracia em relação ao início das obras deixou-se ver até o ano de 1835, quando a Igreja Matriz ainda estava nos inícios de sua edificação. Por esta razão, os habitantes da cidade procuraram organizar uma loteria beneficente em prol das obras do empreendimento religioso17. Documentos da época caracterizam um tipo de discurso persuasivo em função do louvor e das preces a Deus como primeiro e último beneficiário de tal elevação, vale a pena esclarecer que o destinatário direto de tais benefícios era o próprio Rei ou Imperador que, em última instância, mediava as leis que regiam a ordem celeste e terrena.
A grande contribuição para a Igreja veio do povo, principalmente, como reafirma o historiador anteriormente citado, “do suor derramado pela mão escrava”, desejosa de conciliar: os interesses públicos com os privados, em torno de um templo de arquitetura colonial no litoral paulista.
A morosidade da época e a grandiosidade da empresa Matriz arrastaram a obra até os alvores do século XX, momento a partir do qual Washington de Oliveira passa a ser testemunha ocular18. O historiador, pesquisador e ex – prefeito de Ubatuba descreve por meio de fotogramas da cidade, o estado da Matriz no século XIX, uma Igreja totalmente erguida, mas sem torres, ostentando uma pequena água – furtada onde estariam os sinos. Nessas fotografias aparecem as atuais palmeiras plantadas pelo Intendente Municipal Francisco Pires Nobre e, segundo testemunhas, funcionava também um relógio visível à distância e que por muito tempo marcou as horas da cidade19.
A Igreja Matriz hoje tem uma torre que lhe dá o aspecto de inacabada. Até 1904, relata “Seu Filhinho” não existiam bancos no interior da Igreja, as devotas ubatubenses assistiam a missa em pé ou ajoelhadas. Nesse mesmo ano, o Coronel Francisco Pereira foi o festeiro do Divino Espírito Santo que conseguiu que esta festa patrocinasse as despesas na melhoria da Igreja.
O Padre Paschoal Reale, reconhecido vigário na história de Ubatuba atendia esta cidade e a Ilha Bela, na sua gestão demoliu a Igreja do Rosário que ficava na atual Praça Nossa Senhora da Paz. Aproveitando o material e os auxílios angariados fizera rebocar, forrar e dotar o piso da Capela – Mor e transferiu para lá o Altar – Mor de Exaltação à Santa Cruz.
Em 1956, os Frades Franciscanos Conventuais: Frei Tarcísio Miotto, Frei Vittorio Valentini e Frei Vittorio Infantino tomaram conta da Igreja Matriz oferecendo todos os cuidados que ela precisava. Desde 1980, o vigário Frei Mangélico Maneti empreendeu a restauração do templo trocando a madeira, o decorado interior da nave principal restaurando os corredores e substituindo todo o reboco externo até a pintura total da fachada.
Este espaço de devoção é um dos principais atrativos culturais de Ubatuba, a memória viva da evangelização na configuração do contexto urbanístico do Novo Mundo. Além de a Igreja Matriz representar o esforço de sua população, ela é uma imagem fiel do sacrifício da Santa Cruz e do espírito de luta de São Pedro Pescador que hoje é um reflexo da identidade caiçara de Ubatuba.
2. CADEIA VELHA - MUSEU HISTÓRICO
Localização
O edifício da antiga Cadeia Velha e atual Museu Histórico de Ubatuba está localizado bem no centro da cidade, na Praça Nóbrega, próximo ao Municipal.
Horário de funcionamento
De terça à sexta-feira, das 9 às 12 h, e das 13 às 17 h. Aos sábados, das 11 às 17h.
A Cadeia Velha, hoje museu histórico de Ubatuba homenageia a um dos mais importantes historiadores da cidade, Washington de Oliveira20. Por meio da Lei 2092 de 16/10/2001, na gestão do Prefeito Paulo Ramos, modifica-se o nome do museu em homenagem a este insigne escritor. Foi a primeira cadeia do município definida como um edifício público cujo objetivo é proteger a população local dos transgressores da lei que impedem o progresso e a evolução ética dos seus moradores.
O prédio da Cadeia Velha de Ubatuba guarda momentos importantes da história cívica da cidade, transformando-o em um patrimônio histórico cultural de importante grandeza a ser preservado.
Segundo as palavras de Washington de Oliveira, os elementos básicos para a promoção de uma pequena aldeia à categoria de Vila são: o recenseamento populacional, a construção de uma câmara, de uma cadeia e de uma Igreja. Tais quesitos transformaram a antiga Aldeia de Iperoig em Vila no ano de 1637, pelo governador geral do Rio de Janeiro, Salvador Corrêa de Sá e Benevides, denominado-a “Vila Nova da Exaltação da Santa Cruz do Salvador de Ubatuba”.
Assim, a história da Cadeia Velha iniciou-se com transformações importantes na utilização do seu espaço desde o primeiro momento, era para ser uma estação ferroviária que nunca foi utilizada.
A Cadeia Velha foi considerada a primeira construção de linhas modernas na cidade de Ubatuba, nos primórdios do século XX, iniciando-se a sua construção em 1901 e finalizado em 1902. O projeto de reforma foi realizado por Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha, que além de engenheiro era militar, jornalista, escritor e autor de Os Sertões (1902), marco da literatura brasileira. A obra de construção foi executada pelo português Silva - primeiro nome desconhecido- construtor e por Manuel Sapão, mestre pedreiro.
Funcionando nas primeiras décadas do século XX, a Cadeia Velha alojava aqueles que transgrediam “as leis e a ordem” do local, caiçaras bêbados, brigões e presos que eram depois levados ao presídio da Ilha Anchieta. A Cadeia Velha funcionou até o ano de 1972, transferindo-se para uma nova sede, mais ampla, à Rua Professor Thomaz Galhardo devido ao aumento de delinqüentes e detentos no decorrer do progresso da cidade.
Novamente, a Cadeia Velha passa por mais uma reforma deixando de ser uma sede para cárceres, passando suas instalações a serem ocupados por órgãos e instituições como o Centro Municipal de Cultura, a Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e Turismo, entre os anos de 1977 e 1982. Pela Companhia Estadual de Tratamento de Esgoto e Saneamento Básico – SETESB, entre 1984 a 2000. Depois e até os dias de hoje passou então a sediar as dependências do atual Museu Histórico “Washington de Oliveira”.
Todo museu serve para manter viva a memória de uma cultura. Assim o atual museu, através de um acervo de peças indígenas, do período da colonização portuguesa, de imigração francesa e holandesa e do surgimento da cultura autóctone caiçara, além de apresentar objetos de produção artística, é um referencial de preservação da história local.
O primeiro Museu Regional de Ubatuba foi fundado pelo então prefeito Francisco Matarazzo Sobrinho, através do Decreto 25 de 23/11/1966. O historiador da época o senhor Paulo Camilher Florençano, e outros ilustres cidadãos de Ubatuba como Mello Garcia Migliani, Alcir José Quaglio, Luiz Ernesto Kawall e o artista plástico José Vicente Dória da Motta Macedo foram os gestores deste museu, montado nos porões da Câmara Municipal no ano de 1968.
Em 1987, as instalações do museu precisaram mudar de sede devido a má conservação do acervo museológico, o local era muito úmido gerando fungos, bactérias, cupins, comprometendo assim todo o acervo. Desta forma, o museu passou a ser abrigado no andar térreo do Sobradão do Porto – Fundação de Arte e Cultural de Ubatuba – FUNDART, um patrimônio histórico tombado pela superintendência do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – SPHAN ou IPHAN e pelo CONDEPHAAT.
Não oficialmente, o museu passou a chamar-se Museu Hans Staden. Sua visitação foi suspensa depois de um ano por problemas, novamente estruturais do seu acervo e do próprio edifício da FUNDART que teve a sua restauração parada por motivos políticos e administrativos do governo federal da época, o que ocasionou a falta de verba.
Desde 24 de Julho de 2001, a cidade de Ubatuba tem seu museu histórico, montado e reestruturado na atual sede: a Cadeia Velha que passou definitivamente a sediar o Museu Histórico Washington de Oliveira.
Em seu acervo pré-colonial conserva vestígios do início da colonização no Brasil como a Confederação dos Tamoios e a Paz de Iperoig, que estaremos descrevendo detalhadamente no próximo capítulo deste livro. Este mesmo acervo, contém importantes peças arqueológicas dos sítios do Itaguá e Tenório, mostrando traços do antigo caiçara, costumes como a pesca, utensílios, objetos peculiares da época. A Fundação da Vila Nova da Exaltação à Santa Cruz do Salvador de Ubatuba tem suas referências históricas lá inscritas, e também o museu mostra a história dos antigos fazendeiros, dos ciclos do café e da cana-de-açúcar, utensílios e vestígios das Ruínas da Lagoinha, documentos do início da imprensa no final do século XIX.
Homenagens a várias figuras importantes da história de Ubatuba são preservadas como: Manuel Baltazar de Cunha Fortes, Félix Guisard, Gastão Madeira, Idalina Graça, “Ciccillo” Matarazzo, entre outros, o acervo do historiador Washington de Oliveira é conservado na sua integridade. Foram pessoas estas que ajudaram a construir a história da cidade através da sua atuação que trouxe benefícios ao desenvolvimento econômico, político, social e artístico de Ubatuba.
Infelizmente, ainda nos dias de hoje, o Museu de Ubatuba passa por problemas de conservação dos seus acervos e do prédio por ser muito antigo. Como já descrito, o acervo museológico sempre se depara com problemas nas dependências que o abrigam e cabe às instâncias do governo e às instituições preocupadas com a cultura empenharem-se no exercício da função de reunir, processar e difundir este importante patrimônio cultural da cidade.
Ressaltamos que um museu é uma instituição permanente sem fins lucrativos e que está ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento. Por isso, nada mais justo em prol da preservação do patrimônio e da cultura local que a manutenção seja um compromisso de cidadania.
Um museu não é apenas uma instituição estática, parada no tempo, precisa continuamente ser reestruturado, reorganizado, ampliado. É como uma obra que nunca se acaba, um desafio do tempo que perpassa os limites também do espaço a ser modernizado, atualizado, acompanhando assim a evolução da história humana.
Preservar um patrimônio, e acima de tudo, os materiais expostos que representam a vida indígena e caiçara através dos tempos e das ações de civilidade é, sem dúvida, um ato de amor pelo patrimônio cultural de uma nação e de sua história. Uma paixão em materializar, reunir formas do mundo natural ou da cultura material criada pelo homem durante toda uma trajetória histórica sobre o planeta. Uma das funções mais importantes deste museu é a de conservar a produção dos antepassados, estes materiais ampliam potencialmente um enorme campo de atuação e implicam a proteção e se for preciso a restauração de obras originais, assim como a transferência de informação a outros suportes para salvaguardar o conteúdo intelectual. Neste sentido, deveria existir uma série de medidas encaminhadas pelas políticas públicas e a iniciativa privada, para a criação de condições ambientais idôneas para evitar o deterioro progressivo dos materiais e, por outro lado, a intervenção naqueles casos em que a deteriorização se tem produzido. Estas linhas de atuação, preservação e tratamento das obras do museu de Ubatuba apontam para o fim principal desta instituição na preservação da memória do tempo.
Próximos capitulos : Ruinas da Lagoinha e casa da farinha na Picinguaba - a ser publicada no dia 15/09/09 ...Até lá