quinta-feira, 11 de abril de 2024

Caiçaras das regiões Norte e Sul participam de pré-conferência

 



A população caiçara residente nas regiões Norte e Sul de Ubatuba, e membros do setor público, participaram da sétima Pré-Conferência dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais do município na última terça-feira (9), no Centro Cultural Araponga, na região central da cidade.

“Os espaços de pré-conferências são fundamentais para ampliar a participação social e o protagonismo dos povos e comunidades tradicionais na construção de políticas públicas para nossas comunidades no município. A partir delas, vamos dar embasamento para que na II Conferência, as nossas vozes ecoem cada vez mais e a gente consiga construir projetos e políticas específicas no território, junto aos órgãos públicos e ao Conselho dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais de Ubatuba, que também foi uma conquista nossa, que teve início a partir da I Conferência, em 2022”, ressaltou Luísa Vilas Boas Cardoso, comunitária da comunidade caiçara do Prumirim, atual presidenta do Conselho dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais de Ubatuba.

A comissão organizadora registra as falas e demandas apontadas pelos representantes do segmento, e essas serão levadas para a II Conferência, a ser realizada nos dias 21 e 22 de maio de 2024, no Teatro Municipal Pedro Paulo Teixeira Pinto.

Durante as pré-conferências também são escolhidos os delegados e delegadas para a próxima Conferência Municipal. Os encontros permitem ainda um debate aprofundado em torno dos seguintes eixos temáticos:

I – Cultura e Identidade

II – Trabalho e Renda e Pesca Artesanal

III – Saúde e Saneamento Básico

IV – Educação, Inclusão Digital e Esportes e Lazer

V – Assistência Social e Soberania Alimentar e Nutricional

VI – Turismo, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável

VII – Infraestrutura e Direito ao Território

VIII – Transporte e Segurança Pública

 

Calendário das próximas pré-conferências de 2024:

16/04, às 18h30, Centro Cultural Araponga – Caiçaras da região Central, Centro-Sul e Centro-Norte

23/04, às 9h, Aldeia Rio Bonito – Indígenas da Aldeia Rio Bonito

 

Mesa diretora

No último dia 3 de abril, o Conselho Municipal dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais (CMPOCT) se reuniu na sede da Secretaria de Assistência Social para eleger a composição da sua primeira mesa diretora.

O momento marca a história da luta conjunta e organizada dos povos originários e comunidades tradicionais de Ubatuba onde o CMPOCT se fortalece como um espaço de articulação, organização de pautas e construções de caminhos para criar, efetivar e fiscalizar políticas públicas específicas aos territórios tradicionais.

A mesa diretora terá como presidenta Luísa Vilas Boas Cardoso, comunitária caiçara do Prumirim, que ocupa cadeira no conselho pelo Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT).

 

Confira a formação completa da diretoria:

Presidenta: Luísa Vilas Boas Cardoso (FCT)

Secretário Geral: Marco Antônio Braga da Silva (Quilombo da Fazenda)

Relatoria: Carolina Vilela Brito (Secretaria Municipal de Meio Ambiente)

Secretário Executivo: Uirá de Freitas Alves (Secretaria de Assistência Social)

Tesouraria: Ana Carolina Santos Guimarães (Associação Tembiguay)

 

Comissão Fiscal do Fundo Municipal do CMPOCT:

Presidente: Marco Antônio Braga da Silva (Segmento quilombola)

Tesouraria: Ana Carolina Santos Guimarães (Associação Tembiguay)

 

Representantes da Sociedade Civil:

José Márcio Cândido (Instituto Capiá)

Peola Maria Barbosa (representante do segmento Caiçara)

Luiza Kerexu (representante do segmento indígena)

PREFEITURA    DE  UBATUBA    SP

E POR FALAR EM LETRAS...

 


 Arte do Estevan, meu filho (Arquivo JRS)

Arte do Estevan, meu filho (Arquivo JRS)

            Ao relatar que o Antônio de Puruba aprendeu de uma forma bem peculiar (“Pegava um pedaço de jornal e perguntava pra  quem soubesse: Que letra é essa? A pessoa dizia e eu escrevia no chão. Daí em diante escrevi largamente...”), agora digo aqui uma experiência pessoal, o meu princípio de alfabetização: tudo começou no lagamar, na areia molhada da praia. Meu pai, quando íamos cedo na praia esperar os pescadores que vinham de visitar seus tresmalhos, riscava as letras com uma vareta e depois pedia que eu copiasse do jeito que estava. Assim me iniciei nas letras, no caderno bem grande da praia. Primeiro aprendi a escrever o meu nome inteiro. Gostava tanto que, ao ver um espaço limpo, quando voltava para nossa casa, logo pegava um pedaço de carvão para deixar as marcas da minha evolução. Paredes, chapas de madeira, cascas de árvores, pedras... Tudo ganhava rabiscos. Nunca levei bronca por isso.

            A Dona Maria Balio, mulher de muita fibra, dizia que assim que chegou ao Sapê, onde eu nasci, logo se interessou em ensinar às crianças da região. Por volta de 1952 já estava ministrando aulas no Sertão da Quina. Era um trabalho voluntário, gratuito. Além do aprendizado das crianças, também orientava as mães a respeito de cuidados gerais (saúde, higiene, vestimentas etc.), possibilitando aquilo que hoje seria chamado de empoderamento das mulheres. Nenhum papel era desperdiçado quando aparecia. “Eu juntava eles, com a minha máquina de costura, sob a forma de cadernos para usar nas aulas”. Mais tarde, em 1959, ela já estava num novo desafio, na praia Grande do Bonete: “Eu lá ensinava num rancho de canoa, no jundu. As crianças se espalhavam pelas canoas e na areia mesmo. Nem me lembro de quem providenciou lousa e giz. Para os alunos aquilo era um espetáculo maravilhoso. Precisava ver a satisfação deles conforme iam aprendendo! Só quando o tempo virava, com ventania e chuva, é que não tinha como dar aulas, tudo ficava respingado, molhava de verdade. Pouco tempo depois, o Adelino cedeu a sua sala para servir de escola. A casa dele era no canto de lá [esquerdo, depois da barra] da praia. Eu andava tudo isso a pé. Ficava se segunda até sábado cedo com eles. O fim de semana vinha para casa”. (Do Sapê até a Grande do Bonete, gente!).

Outra coisa desta mulher valente: promovia a festa de Natal. Conseguia angariar uns presentes com quem tinha mais dinheiro e distribuía para nos alegrar. Foi vereadora, juntamente com o seu filho Zé do Prado, num tempo em que era apenas um trabalho voluntário, de serviço ao município, sem nenhuma remuneração. Me recordo de um evento religioso no Largo do Sapê, no final de 1968, quando a banda da cidade, entre outras músicas, executou A Banda, de Chico Buarque. A apoteose foi quando um helicóptero sobrevoou o povo caiçara concentrado ali. Todos acenavam com um lenço branco para saudar a imagem de Nossa Senhora que diziam estar nele, nos abençoando. Muita gente chorava, mas eu não entendia a razão.  O que importava para mim era a festa, o povo reunido, o espaço lotado com a nossa gente. Que beleza!


Ubatuba , 10 de Setembro  de  2020