terça-feira, 6 de abril de 2021

A PESCA EM UBATUBA - ESTUDO SÓCIO ECONOMICO - 1973 - 8 ª PARTE

 



Com  base   numa publicação da Extinta SUDELPA  -Superitendencia do Desenvolvimento do Litoral de  São  Paulo compartilho aqui em partes a  ref. publicação .......Levantamento sobre a pesca na região de  Ubatuba SP  nos anos de 1973..



QUADRO 22

                    E S T R U T U R A    ETÁRIA DOS PESCADORES -          UBATUBA

                                                             Taxas de Idade

             Categorias

                                   10/          20/          30/          40/          +              To-

                                         %            %            %            %              %

                                   19           29           39           49           50             tal

     Pescadores                     7    7.8    22    24.1   17    18.7 19      20.9   26      28.5 91

     Pescadores Industriais         5    12.5   14    35.0   10    25.0    9    25.5       2    5.0   40

     Pescadores Artesanais          2    3.9     8    15.7    7    13.7   10    19.7   24      47.0   51

                     A análise das idades é significativa na medida em que é possível comparar

os pescadores industriais com os artesanais. Em Ubatuba, enquanto que somente 30.5% dos pes-

cadores industriais tem mais que 40 anos, essa porcentagem se eleva a mais de 66.5% entre os

artesanais. Isso revela que há pouca incorporação de indivíduos jovens a esse tipo de pesca,

pois se entre os pescadores industriais há mais de 47.5% entre 10/30 anos de idade, a propor-

ção decresce visivelmente entre os artesanais que só contam com 19.6% nessa faixa. A estrutu-

ra etária revela portanto, que enquanto os indivíduos jovens ingressam na pesca embarcada, o

mesmo não ocorre entre os artesanais. Aliás, uma rápida análise na composição etária dos nú

cleos, mostra que em Picinguaba, existe 32% dos pescadores com mais de 40 anos, en-

quanto que em Maranduba, onde predomina a pesca artesanal, 100% dos pescadores tem mais de 50

anos. No Lázaro (outro núcleo artesanal penetrado pelo turismo) a proporção de pescadores

com mais de 50 anos se eleva também a 66%.

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      10.2.   A Mobilidade Geográfica

 

 QUADRO 23

 

                  LOCAL DE NASCIMENTO DOS PESCADORES -                       UBATUBA

 

 

                                                           Local de Nascimento

       Categorias de Pescadores

                                                                De outras

                                        Do Local     %                        %        De fora          %

                                                                 Praias

 

     Total de pescadores                  72        79.1          13         14.2         6            6.6

 

 

     1. Pescadores Industriais            29        72.5           8         20.0         3            7.5

 

     2. Pescadores Artesanais             43        84.5            5         9.8         3            5.9

 

 

 

 

                     Em Ubatuba, a maioria dos pescadores nasceu na praia em que atualmente

 mora (79.1%), revelando que existe uma pequena mobilidade geográfica. Essa porcentagem é me-

 nor entre os industriais (72.5%) indicando que estes possuem uma maior mobilidade, pois 27.5%

 são provenientes de outras localidades.

                    Cruzando-se essa informação com o tempo de moradia no local, observa-se

         maioria dos pescadores habitava a praia por mais de 20 anos (76.8%). Como era de se

$.«perar, uma porcentagem maior de pescador industriais (22.5) tinham mudado para a praia en-

  tre 1/10 anos, enquanto que só 5.8% dos artesanais o fizeram no período considerado.

 

 

      10.3.   Estrutura Ocupacional

 

' QUADRO 24

 

                           OCUPAÇÃO DOS PESCADORES -               UBATUBA

 

 

 1               Categoria dos Pescadores                Pesca      %       Lavoura   %       Outras     %

 

 

 

 \l de Pescadores :                                        80      87.8       6       6.6        5       5.5

 1    T Pescadores Industriais                             40     100.0       0        0.0       0       0.0

 L    2. Pescadores Artesanais                             40      78.4       6       11.8       5       9.8

 

 

 

                      A análise das ocupações indicam que enquanto 100% dos pescadores industri-

      aíirmam que sua ocupação principal é a pesca, essa proporção cai para 78.4% entre os artesa-

         que tem também outras atividades. Entre os pescadores artesanais, portanto, 22% afirmam

       tem outras ocupações, especialmente a lavoura e serviços. Em termos de núcleo, naqueles

        como Picinguaba, a pesca é uma atividade fundamental, 100% dos pescadores (tan-

     ^artesanais, como industriais) afirmaram encontrar na pesca sua ocupação principal, e n q u a n t o

       naqueles núcleos em que a agricultura é praticada ou onde as construções de casa para tu-

 

 

                                                                                                               47


rista são uma realidade, parte dos pescadores artesanais exercem outras atividades. Verificou-se

em Ubatuba, que para parte dos pescadores artesanais, especialmente os não motorizados, a pes-

ca não é atividade suficiente para lhes garantir um mínimo vital, tendo que recorrer à comple-

mentação da renda em outros trabalhos.

                    À questão se tinham outras ocupações além da pesca, no entanto, 27.5% dos

pescadores industriais responderam afirmativamente. Essa proporção é explicada quando se per-

cebe que mesmo entre os pescadores industriais muitos deles saíram a pouco da lavoura e man-

tém com ela muitos vínculos. Assim em Camburi, por exemplo, é comum o pescador embarcar

6 meses nas traineiras e depois ficar 2 ou 3 meses em casa, especialmente no inverno "em que

o trabalho é muito duro". Passada esta fase, o pescador deixa os trabalhos da roça ou outras

atividades e volta a empregar-se na pesca industrial. Já entre os pescadores artesanais, os que

afirmaram ter outras ocupações se elevam a 57%. Evidentemente, outra vez os que são mais in-

constantes nas atividades pesqueiras são os artesanais não motorizados.

                    É interessante se observar que, dos 27.5% de pescadores industriais que para-

lelamente se dedicam a outras atividades, a maioria (86.7%) trabalha na roça enquanto que en-

tre os artesanais nessa categoria, somente 59.4% cultivam o solo, ao passo que 13.5% são tam-

bém pequenos comerciantes. Atesta-se assim, uma maior ligação dos pescadores industriais com

a roça, donde grande parte deles saiu (85.8) antes de embarcar. Esses dados são importantes,

Dorque atualmente se verifica uma passagem direta do lavrador à condição de pescador industrial quan-

do em períodos anteriores os lavradores se dirigiam ao artesanato. Pode-se deduzir daí que o arte-

sanato pesqueiro na presente situação não é muito atraente como atividade económica sofrendo

contínuo esvaziamento.

                     No que diz respeito a outras atividades, deve-se observar que em Ubatu-

ba, 24.4% dos pescadores afirmaram trabalhar no artesanato, confeccionando artigos de palha,

madeira ou redes, mas desses, só 30% o faziam para vender. Evidentefnente a porcentagem

maior dos que faziam o artesanato estava entre os pescadores artesanais, 32%. Mesmo             nesse

caso, a quase totalidade dos objetos produzidos era para o uso caseiro ou profissional (rede) - 85%.

QUADRO 25

                                 TEMPO DE TRABALHO NA PESCA

           Categoria                                     Tempo de Pesca

              de

          Pescadores             Sempre    %     1/4   %     5/9   %      10/19    %     +20     %

     Total de Pescadores          32      35.0    4    4.4    8     8.8    23     25.2    24    27.4

     1. Pescadores Industriais     14     35.0    2    5.0    6    15.0    10     25.0     8    20.0

     2. Pescadores Artesanais      18     35.2    2    3.9    2     3.9    13     25.5    16    31.4 .

                                                                                                       .1

48


                     Esta tabela é significativa na medida em que permite fazer algumas inferên-

cias sobre a profissionalização dos pescadores. É claro que não é somente a permanência no

setor que permite uma profissionalização. Outros elementos são também importantes, como a

estrutura de valores, a intensidade do exercício de profissão, etc. Entretanto pode-se observar

que somente 35% dos pescadores tinham trabalhado sempre na pesca (sendo possivelmente filhos

de pescadores) e não se manifestou diferença significativa entre os industriais e os artesanais:

entre estes últimos, mais de 55% tinham entrado há mais de 10 anos na pesca, vindo confir-

mar outras informações de que a atividade pesqueira artesanal se tornou mais sólida a partir

do estabelecimento de um mercado de compra e venda do pescado no início da década de

1950, com a construção da estrada ligando Ubatuba a Caraguatatuba e do Entreposto. Os que

passaram para a pesca entre 1/9 anos, somaram 20% entre os industriais e só 8% entre os ar-

tesanais, revelando que os primeiros continuam ingressando na pesca com maior intensidade que

os segundos.

                    No que diz respeito às ocupações anteriores à pesca, 86% dos pescadores in-

dustriais tinham saído da lavoura, enquanto que essa porcentagem se reduzia à metade (43.5)

entre os artesanais. De fato, esse fenómeno é bem visível em Picinguaba e adjacências onde a

grande maioria dos jovens que trabalham embarcados tiveram como última ocupação a lavoura.

Esse componente rural do pescador embarcado, e o fato de sua família dispor de um pedaço

de terra perto ou longe da praia funciona como um refúgio quando ele não está trabalhando.

                     Mesmo assim é evidente que a vinculação do pescador industrial com a ter-

ra é menor que a do artesanal. Se o primeiro passa direto da lavoura para o barco é porque

a deterioração das condições da agricultura no local impedem-no de continuar nessa ocupação.

Por outro lado, o contato maior do embarcado com os centros urbanos maiores como Santos

e Rio de Janeiro faz com que ele vá absorvendo valores urbanos que se manifestam inicialmen-

te na maneira de se comportar, no modo bizarro de se vestir imitando os jovens da c i d a d e ,

etc. Nas praias como Picinguaba, no "claro" pode-se observar os jovens embarcados trajando ca-

misas estampadas, calças justas e usando cabelo comprido, fenómeno que não se encontra nos

artesanais das praias geograficamente mais isoladas.

                     Um outro sistema de vinculação com as atividades agrícolas é o uso ou não

do forno de fazer farinha de mandioca. Enquanto que 29,5% dos artesanais afirmavam ter o

forno, somente 15.5% dos industriais o possuíam. Dentro das sub-categorias a diferenciação é

até mais significativa, pois entre os artesanais "donos dos aparelhos de pesca" a porcentagem se

elevava a 37.1% enquanto que para os camaradas, não passava de 12.5%. Evidentemente a sub-

categoria dos mestres de barco é a que mais se identifica com a pesca: nenhum deles exerce ou-

tra atividade paralela e não tem forno de farinha.

                     Em termos de praias é interessante se obsen/ar, que a atividade  agrícola

exercida conjuntamente com a pesca pelos artesanais é mais presente em praias como Ubatumi-

rim, Camburi, ao norte do município. Aliás é Ubatumirim que possui o maior número de agri-

cultores nessa parte norte do município e eles são fornecedores de farinha de mandioca para

Picinguaba, núcleo agora mais especializado na pesca da sardinha. Já nas praias mais próximas à

cidade as atividades complementares não são agrícolas e sim do ramo de serviços (construções

civis, biscates, etc.) como é o caso do Lázaro, Enseada e Maranduba.

                    Quanto a algumas características gerais da população de pescadores é desne-

cessário se afirmar que vivendo em sua grande maioria em situação de extrema marginalização,

pois seus rendimentos em geral só lhes permitem a sobrevivência, os pescadores apresentam bai-

xos índices de alfabetização. Em Ubatuba, só 7.7% do total podem ser considerados funcional-

mente alfabetizados. A enorme maioria ou é semi-alfabetizada ou simplesmente analfabeta. Entre

os pescadores industriais o índice é mais elevado que entre os artesanais (12.50 contra 2.9%)

pois estes são geralmente mais novos e são obrigados pelo menos a ler e escrever para tirar a

 

                                                                                             49


carteira de trabalho. Entre os nnestres de barco a totalidade é alfabetizada, pois cabe a eles a

contabilidade da pesca, o embarque e desembarque dos tripulantes, a leitura de instrumentos, etc.

                    Em Ubatuba, 61.5% dos pescadores moram em casa própria, normalmente em

situação precária, enquanto que os demais tem casas cedidas ou alugadas situação menos co-

mum. Entre as sub-categorias estudadas, a dos camaradas é que apresenta uma maior proporção

dos que não tem casa própria, 62.5%. Aliás, dentre as categorias, a dos camaradas é a que está

em piores condições, pois não possuindo instrumentos de trabalho, vivem na dependência de

outros (96.1% deles são analfabetos ou semi-alfabetizados).

                    Nas praias de Ubatuba, próximo à sede municipal, consideradas entre as mais

belas do sul do país, o pescador caiçara sofreu, desde a abertura da estrada, um processo de

expulsão de suas casas pelas firmas loteadoras ou pessoas de São Paulo, que a troco de nada

adquiriram a posse das terras e os foram desalojando para lugares mais distantes. Em algumas

praias o fato dos ricos proprietários, geralmente da Capital, cercarem terrenos impede os pesca-

dores de chegarem à praia com suas embarcações. Constata-se portanto, que com a vinda do

turismo houve não só a desorganização da pesca artesanal não motorizada, mas uma marginali-

zação maior ainda, com o afastamento coagido de seu ambiente natural de trabalho: o mar.

11.   PARTICIPAÇÃO SOCIAL

                  Em Ubatuba, percebe-se uma participação relativamente fraca em atividades

comunitárias. Comparando-se com as comunidades agrícolas as que se dedicam à pesca apre-

sentam formas menos intensas de solidariedade e ajuda mútua.

                    Uma hipótese que explicaria, em parte a questão, se fundamenta no fato de

o pequeno pescador explorar um bem comum, que é o mar. Na medida em que ele passa a

conhecer os lugares de pesca melhores, técnicas mais apropriadas, torna-se cioso de seus segre-

dos e prefere explorá-los sozinho ou com a ajuda de um camarada. No fundo ele sente que na

medida em que levar mais gente para o pesqueiro, sua produção vai ser menor. Um outro fa-

tor que parece ter aumentado o individualismo parece ser a proliferação de seitas protestantes

que, agressivamente, romperam o mundo de valores religiosos mais ou menos uniforme antes

existente. Assim, como os protestantes não vão a festas, consideram a dança de São Gonçalo

uma "adoração de imagens", foi-se rompendo a solidariedade anteriormente existente. Sub-

jacente a todos esses fenómenos está no fundo a expansão da economia monetária e do princj

pio do lucro, como racionalizador das atividades económicas e sociais. O mutirão já não dá

mais certo, pois custa muito se comprar os mantimentos para a festa que o segue. Na medida

em que de fato, os indivíduos se afastam da lavoura a produção de mantimentos é mais cus-

tosa e a comida tem que ser comprada, onerando os custos do mutirão.

                   Por outro lado, a maioria dos proprietários impossibilitados de fornecer ali-

mentos ao fim do mutirão, davam somente cachaça durante o baile, o que contribuía         ainda

mais para desordens e brigas que afastavam as danças, e desacreditavam a atividade. É o rom-

pimento de uma estrutura marcada pela produção do auto-consumo para uma outra mais volta-

da para o mercado em que um dos processos é o declínio da autoridade tradicional.

                   De qualquer maneira, o mutirão é antes de tudo uma forma de solidarieda-

de entre indivíduos que se dedicam à lavoura. A pesca com exceção do arrastão de praia, que

praticamente já sumiu de nosso Litoral, não comporta o mutirão.

                  Mourão estuda esse processo no Litoral Sul e apesar de analisar o mutirâ'o

ou outras formas de ajuda mútua sob o prisma de controle social e de sua função de desesti-

50


 mular o comportamento divergente, chega a conclusões semelhantes: "Embora os fatos ressalta-

 dos por uns informantes se passem já numa época em que a crise a que vimos aludindo cons-

 tantemente, era já uma realidade o que até certo ponto explica o ocorrido, eles demonstram

já uma certa ruptura com o sistema de valores. A passagem a pesca, enfatizou um de nossos infor-

 mantes, possibilitou uma maior individualização pois bastava encontrar dois companheiros e sair

para a pescaria, "sem dar satisfações a ninguém". Terminada a pescaria, aguardava o barco de

Santos que pagava imediatamente e com dinheiro "vivo". " O homem ficava mais dono de s i " ,

comenta "gastava o dinheiro como queria, e não dependia de ninguém".(10)


CONTINUA.........DIA  08     DE    ABRIL DE 2021


FONTE ORIGINAL............


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