Escola da praia da Almada |
Foi um choque para mim descobrir, há dez anos, o abandono em que se achava o litoral norte de São Paulo. Acompanhando meu marido, que é diretor do Instituto Geográfico e Geológico, eu entrara na mata, onde faziam levantamentos para fixação de divisas entre os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro.
A montanha chegava quase à beira da praia, que se espichava sem fim. Nesse cenário belo e grandioso, a população vivia em regime de fome, morando em casebres de pau barrado, cobertos de sapé, com uma esteira à guisa de cama, um banco tosco, um fogão de três pedras sobre as quais se equilibrava a única panela (muitas vezes de lata). Era essa gente que havíamos apelidado de caiçaras. A verdade, porém, é que Ubatuba, o principal centro da zona, cuja população de hoje orça pelos 1.500, já fora mais importante que Santos. Seu nome, no idioma tupi, significa local onde há abundância de caniços próprios para flechas. Fundada em 1600, dentro em breve tornou-se centro exportador e importador não só para a zona do Vale do Paraíba como para o interior de Minas. Os produtos de exportação desciam a serra em lombo de burro e as pedras de cantaria, seda, sal, louças e outras importações subiam do mesmo modo. Ubatuba tinha sua própria frota de barcos que faziam cabotagem até o Rio da Prata ou Pernambuco, levando os produtos dos engenhos de açúcar, das serrarias e das olarias que ali abundavam. O ouro de Minas Gerais seguia de caravela para Lisboa. Diversos foram os flibusteiros ou traficantes franceses ou ingleses que ali resolveram estabelecer-se ou, naufragados na costa, acabavam ficando. Muitos dos atuais caiçaras ainda exibem nomes e traços fisionômicos que denotam esse legado racial, de mistura com sua herança índia, negra e portuguesa.
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