segunda-feira, 6 de agosto de 2018

A LENDA DO CORPO SECO

A lenda do Corpo Seco é contada de geração em geração e tem seu episódio final na região da Barra da Lagoa.
Dinico, como todos o conheciam, era um rapaz de costumes e vícios abomináveis, causava ao mesmo tempo compaixão e repulsa. Seus pais viviam na mais profunda miséria, e ele, último filho, depois que os irmãos tomaram rumo na vida, ficou para martirizar impiedosamente aquele casal de velhinhos. Dinico vivia na farra e na jogatina, trazendo muito desgosto à família, até que o pai acabou morrendo de desgosto. A mãe continuou sofrendo com as maldades do filho, que até batia nela.


Um dia, ao chegar à casa, ébrio, depois de uma noitada, encontrou a mãe muito doente no leito de morte a lhe pedir um pouco de água, e ele respondeu:
-Tens sede? Por que não morres? Toma, mata tua sede.
E assim dizendo passou rapidamente o pé, no braseiro que crepitava a um canto, lançando brasas sobre a velha moribunda. Depois, caminhou apressadamente para a porta, mas uma força estranha tolheu-lhe os passos, parece que para fazê-lo ouvir sua mãe dizer:
– Miserável! Vai! A minha maldição te perseguirá sempre! Não terás sossego em tua vida nem paz depois de morto! Bandido! A própria terra te rejeitará…
Com a morte da mãe, a maldição desta não se fez esperar, o rapaz viu-se na miséria, abandonado, sem amigos, sem uma palavra de consolação. Tudo o rejeitava. Dizem que as árvores negavam-lhe sombra, deixando atravessar entre as ramagens os raios escaldantes do sol, e as fontes de água ferviam se o desgraçado ia beber.
Acabou suicidando-se, e o encontraram-no enforcado no ramo de uma árvore, pendente sobre o Rio Lagoa, conhecido por Barra da Lagoa. Tratou-se do seu enterro, quando, no dia seguinte ao do sepultamento, o coveiro deparou com o cadáver de Dinico sobre a sepultura. Assombrado com esse fato inédito, tratou de enterrá-lo novamente, mas de novo o cadáver emergiu à flor da terra. Contaram, depois, que certa noite espectros macabros foram vistos transportando aquele corpo mumificado para a Barra da Lagoa, talvez porque tivesse morrido lá.
Corpo Seco
Véspera de Natal, e dezenas de presépios estavam sendo armados por toda a vila, e duas moças, Chiquinha e Clarita, foram explorar as margens do Rio Lagoa, à procura de liquens e conchas para o adorno natural da cena de Belém, quando Chiquinha encontrou um cepo disforme, coberto de belíssimas parasitas. Sofregamente pôs-se a catar aquelas preciosidades, e depois de limpá-lo todo, já se retirava, quando ouviu uma voz dizer:
– Moça, aqui tem mais.
Voltou-se. Soltou um grito agudo e caiu sem sentidos. O cepo que há pouco lhe fornecera delicadas plantas, mudava de posição, deixando transparecer perfeitamente as formas de um corpo humano, ressequido e corroído pela ação do tempo. Dizem que até hoje, o Corpo Seco do degenerado que a terra não quis receber, encontra-se lá na Barra da Lagoa, atendendo aos rogos da velha Maria Rosa.
Fontes:
Narração de Washington de Oliveira (“Seu Filhinho”), extraída do  livro “Ubatuba, lendas e outras histórias”
https://ocalafrio.blogspot.com.br/2013/06/a-lenda-do-corpo-seco.html

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