Marcelina, jovem graciosa e alegre, de
repente pareceu aniquilar-se, alimentando-se mal, perdendo as cores sem
ânimo até para as tarefas costumeiras. Remédios já os havia tomado em
grande quantidade, mas nada resolvia. Dias se passaram, até que certa
madrugada, ao raiar do dia, Sinhá Anália,mãe da moça, ouvindo soluços
provindos do quarto da filha para lá se dirigiu, encontrando-a
murmurando palavras desconexas que pareciam ser:
– Não! Não vá… não quero… espere…
Então Marcelina, vendo a mãe ali postada, com voz entrecortada começou a falar:
Passava o tempo, quando certo dia bateu a porta de D. Anália, um monge velhinho, pedindo alguma coisa para comer, e esta fazendo-o entrar, agasalhou-o, deu-lhe de comer e atendendo às suas indagações, relatou-lhe toda a razão da tristeza que consternava aquela casa. O velhinho, já ouvira falar do monstro satânico que atormentava a população daquele bairro, e justamente por isso é que ali viera, por inspiração divina, a fim de libertá-la da opressão que lhe infringia o Espírito do Mal. O venerável ancião caminhou em direção á toca que abrigava o dragão da Sununga. Ali chegando, o monge ergueu os braços num largo e lento gesto do sinal da cruz, e ao murmúrio de piedosa prece, espargiu por sobre a pedra a água que levara num pequenino púcaro.
Naquele instante um trovão violento fez estremecer a terra, e o mar, rugindo em doidas convulsões, projetou-se violento contra a impassibilidade das rochas, para retroceder, abrindo-se ao meio, bem em frente à toca, dando passagem ao monstro que por ali avançou rugindo, sumindo ao longe, na profundeza das águas. Hoje, quem se postar no interior da lendária gruta, perceberá cair lá de cima, das ranhuras da pedra, uma seqüência de pequeninas gotas que se infiltram na areia branca e fina que alcatifa o chão. Dizem, alguns, que são remanescentes gotas da água benta espargida pelo monge, que ainda caem, a fim de que o dragão jamais possa voltar. Outros, porém, afirmam que são lágrimas de Marcelina, que lá voltou muitas vezes, na esperança de que o dragão, feito moço bonito, ainda voltasse, para ficar com ela.
Fonte: Narração de Washington de Oliveira (“Seu Filhinho”), extraída do livro “Ubatuba, lendas e outras histórias”
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