sábado, 8 de fevereiro de 2014

ESPECIAL DO LIVRO " UBATUBA, ESPAÇO , MEMORIA E CULTURA " - PARTE 111






Jorge lembra com emoção e prazer de sua infância em Ubatuba. Brincava, caçava passarinho com estilingue, vivia grandes aventuras desfrutando a natureza junto a seus amigos. Uma época em que ganhar alguns réis, era um privilégio permitido também às crianças. Ele conta que pelo menos uma vez por semana, atracavam navios na costa, como o “Aspirante” ou o “Taipava”, trazendo além de cargas e mantimentos, alguns poucos turistas que ficavam no antigo e famoso Hotel Felipe. Jorge e alguns amigos corriam pelo caminho que levava até a praia do Matarazzo, onde esperavam pelos pequenos botes que traziam até a areia os tripulantes do navio e as cargas. Então, ajudavam os turistas com suas malas levando-os até o hotel Felipe, ganhando boas gorjetas. Jorge Fonseca lembra que não era qualquer um que ficava em estadias naquele hotel pois suas diárias chegavam a vinte e trinta mil réis.






“A minha mocidade – nos diz o entrevistado - começou a ser mais aventureira.” Sobretudo quando começou a aprender a caçar, utilizando espingardas 36 e depois uma 28. Acompanhado de alguns amigos, embrenhavam-se nas matas praticamente virgens de Ubatuba, algumas vezes chegando às divisas com outros municípios onde ficavam de uma a duas semanas. Mas lembra que não era necessário ir tão longe para achar as caças preferidas e até um rancho eles construíram em local bem próximo como o Taquaral. Ali eles encontravam uma diversidade de animais como cotia, raposa, jacutínga, “porco do mato” e uma variedade de aves com o tucano, macuco, sabiá e outros. Jorge hoje se arrepende desta prática predatória, pois muitos animais tinham suas vidas interrompidas por um tiro de espingarda. Ele lembra que uma vez, até macaco eles caçaram, atirando pelo menos em dois deles e que ao limpá-lo, na hora de pelar, quando o viu, disse que parecia muito com gente. Mesmo assim, já que caçaram, comeram o tal macaco. Em uma outra oportunidade, jurou nunca mais repetir o fato, atirou em uma preguiça e quando chegou perto dela para pega-la já morta, havia um filhote agarrada a barriga da mãe. Jorge ficou triste e chateado, jurando que nunca mais mataria este tipo de animal, bem como os macacos. O filhote da preguiça ele acabou levando para terminar de criá-lo, mas acabou dando a uma mulher que prometeu criar e depois soltá-la para a mata.

Jorge lembra também que já moço, aprendeu a fazer tarrafa, sozinho e que depois, em vez das caçadas, preferiu as pescarias de tarrafa em rios[1]. Naquela época em Ubatuba, ninguém sabia fazer tarrafa, então um dia desses Jorge comprou um novelo de linha para tentar fazê-la sozinho, como não conseguia , resolveu dormir. Conta que sonhou estar fazendo a tarrafa de acordo com sua intuição e ao acordar, rapidamente, tentou lembrar do feitio, assim fez e teceu sua primeira tarrafa. Começou a pescar, jogando tarrafa no rio da Bica, na Picinguaba e no rio Quiririm na praia do Ubatumirim, local onde fez muitas amizades que permanecem até os dias de hoje.

O entrevistado disse que antigamente passava fome em Ubatuba quem queria, eram muitos peixes, uma variedade como tainha, robalo, carapeva e havia muito peixe tanto no mar como nos rios. Conta também que na praia do Itaguá havia cercos que chegavam a amontoar tantos peixes que ao final da distribuição se enterravam as sobras. Em época de tainhas, elas chegavam à baia do Itaguá em grandes cardumes, eram cercadas pelas canoas dos senhores Antonio Vieira, Alfredo Vieira, Benedito Junior e os Liberatos. Eram grandes redes, puxadas até a praia. Uma grande quantidade de enormes tainhas, que ao final eram repartidas entre eles e distribuídas à comunidade. Jorge Fonseca sente que hoje a coisa é bem diferente daqueles tempos de fartura. Diz que hoje os peixes são mirrados e a quantidade que vem nos arrastões da praia do Itaguá, mal alcançam para uma família de poucas pessoas.


[1] Tarrafa é uma espécie de rede em forma de funil com chumbo nas suas bordas, que ao ser lançada na água se abre em um raio de extensão considerável, afundando com o peso no sentido para baixo propiciando a captura dos peixes.


CONTINUA............Sequencia da pagina 336......

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