Jorge lembra com emoção e prazer de sua infância em Ubatuba. Brincava, caçava passarinho com estilingue, vivia grandes aventuras desfrutando a natureza junto a seus amigos. Uma época em que ganhar alguns réis, era um privilégio permitido também às crianças. Ele conta que pelo menos uma vez por semana, atracavam navios na costa, como o “Aspirante” ou o “Taipava”, trazendo além de cargas e mantimentos, alguns poucos turistas que ficavam no antigo e famoso Hotel Felipe. Jorge e alguns amigos corriam pelo caminho que levava até a praia do Matarazzo, onde esperavam pelos pequenos botes que traziam até a areia os tripulantes do navio e as cargas. Então, ajudavam os turistas com suas malas levando-os até o hotel Felipe, ganhando boas gorjetas. Jorge Fonseca lembra que não era qualquer um que ficava em estadias naquele hotel pois suas diárias chegavam a vinte e trinta mil réis.
“A minha mocidade – nos diz o entrevistado -
começou a ser mais aventureira.” Sobretudo quando começou a aprender a caçar,
utilizando espingardas 36 e depois uma 28. Acompanhado de alguns amigos, embrenhavam-se
nas matas praticamente virgens de Ubatuba, algumas vezes chegando às divisas
com outros municípios onde ficavam de uma a duas semanas. Mas lembra que não
era necessário ir tão longe para achar as caças preferidas e até um rancho eles
construíram em local bem próximo como o Taquaral. Ali eles encontravam uma
diversidade de animais como cotia, raposa, jacutínga, “porco do mato” e uma
variedade de aves com o tucano, macuco, sabiá e outros. Jorge hoje se arrepende
desta prática predatória, pois muitos animais tinham suas vidas interrompidas
por um tiro de espingarda. Ele lembra que uma vez, até macaco eles caçaram,
atirando pelo menos em dois deles e que ao limpá-lo, na hora de pelar, quando o
viu, disse que parecia muito com gente. Mesmo assim, já que caçaram, comeram o
tal macaco. Em uma outra oportunidade, jurou nunca mais repetir o fato, atirou
em uma preguiça e quando chegou perto dela para pega-la já morta, havia um
filhote agarrada a barriga da mãe. Jorge ficou triste e chateado, jurando que
nunca mais mataria este tipo de animal, bem como os macacos. O filhote da
preguiça ele acabou levando para terminar de criá-lo, mas acabou dando a uma
mulher que prometeu criar e depois soltá-la para a mata.
O entrevistado disse que antigamente passava fome
em Ubatuba quem queria, eram muitos peixes, uma variedade como tainha, robalo,
carapeva e havia muito peixe tanto no mar como nos rios. Conta também que na
praia do Itaguá havia cercos que chegavam a amontoar tantos peixes que ao final
da distribuição se enterravam as sobras. Em época de tainhas, elas chegavam à
baia do Itaguá em grandes cardumes, eram cercadas pelas canoas dos senhores
Antonio Vieira, Alfredo Vieira, Benedito Junior e os Liberatos. Eram grandes
redes, puxadas até a praia. Uma grande quantidade de enormes tainhas, que ao
final eram repartidas entre eles e distribuídas à comunidade. Jorge Fonseca
sente que hoje a coisa é bem diferente daqueles tempos de fartura. Diz que hoje
os peixes são mirrados e a quantidade que vem nos arrastões da praia do Itaguá,
mal alcançam para uma família de poucas pessoas.
[1] Tarrafa é uma espécie de rede em forma de funil
com chumbo nas suas bordas, que ao ser lançada na água se abre em um raio de
extensão considerável, afundando com o peso no sentido para baixo propiciando a
captura dos peixes.
CONTINUA............Sequencia da pagina 336......
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