quarta-feira, 6 de junho de 2012

Comunidades Caiçaras



Comunidades Caiçaras

O termo caiçara, que se origina do vocábulo guarani caá-içara, utilizado para denominar estacas colocadas em volta da aldeia ou nos cercados de peixes, passou, com o tempo, a designar palhoças construídas ao longo das praias, tendo evoluído para o significado atual de morador ou comunidade do litoral nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná. (Adams, Cristina. Caiçaras na Mata Atlântica: Pesquisa Científica versus Ambiental. Dissertação de Mestrado. USP. São Paulo, 1996)
Caiçara pode ser entendido como uma mescla etno-cultural formada por descendentes de índios e portugueses, cuja forma de vida encontra-se sustentada na agricultura itinerante, pesca artesanal, extrativismo vegetal e artesanato, no litoral paulista, cariOC1­paranaense e do norte do Estado de Santa Catarina. (Diegues, Antônio Carlos. Aruda, Rinaldo S.V. (org.) Saberes Tradicionais e Biodiversidade no Brasil. Ministério do Meio Ambiente / USP. Brasília. 2001)

Até meados do século passado, os caiçaras eram a população predominante no litoral Norte, vivendo ao modo de seus antepassados, com pouco contacto com os "paulistas” ­e cujas relações de parentesco identificavam as comunidades por oposição às "gentes de fora". A organização social das comunidades caiçaras não diferenciava o trabalho do lazer, pois não eram vistas como atividades absolutamente opostas. A terra não  tinha valor mercantil, mas de uso, e os seus limites e direitos eram respeitados, embora não houvesse cercas ou escrituras de compra e venda. O ideário de comunidade ­sobrevivia através de práticas solidárias como os mutirões nas colheitas e a divisão seus resultados. A pesca era uma atividade coletiva cujos vestígios podem ser observados ­até hoje no arrasto das redes na praia e na distribuição do pescado excedente.
Com a ampliação dos meios de comunicação, a abertura das grandes auto-estradas, ­a construção da Rodovia Rio-Santos e das demais rodovias locais, o surgimento  do turismo, a especulação imobiliária e a ampliação das atividades urbanas, o isolamento da região é rompido, e a organização social e cultural dos caiçaras é fortemente abalada.
A terra como território da comunidade é substituída pela propriedade individual com valor de troca. Os produtos da sociedade urbana e industrial passam a ser desejados e valorizados pelos caiçaras. A sua terra passa a ser adquirida pelos especuladores por valores irrisórios e/ou através da troca em espécie, por radinhos de pilhas, lanternas, ­roupas, bicicletas e toda sorte de bugigangas e quinquilharias, ao mesmo tempo que se exerce pressão legal e, na maioria das vezes, ilegal para que deixem a terra que ocupam e na qual produzem. Sem a terra, e, portanto, desprovidos das condições de reproduzir sua própria existência material conforme o modo de vida da comunidade, os caiçaras são impelidos a venderem o seu trabalho como caseiros, serviçais, serventes de pedreiros, ambulantes etc. cujos rendimentos quase nunca são suficientes para sua manutenção e a da família. Passam, então, a morar na periferia dos núcleos urbanos, muitas vezes em áreas de risco ou irregulares, em habitações precárias, sem as mínimas condições sanitárias, contribuindo, assim, para a poluição das águas, a degradação dos recursos naturais e a disseminação de doenças endêmicas.
Com o crescimento do turismo no Litoral Norte e a forte presença da classe média na região, amplia-se o processo de exclusão social e a percepção das desigualdades sociais. A solução para o problema, muitas vezes, tem sido buscada pelos membros da comunidade de forma individual, através de atividades marginais, da qual se aproveitam os traficantes e toda sorte de exploradores da miséria humana.
Algumas dessas comunidades, contudo, não foram totalmente afetadas por esse processo de desestruturação, por permanecerem relativamente isoladas na região. Existem, hoje, no litoral Norte 19 comunidades isoladas, constituídas por 1900 pessoas.
A maioria delas está localizada no município de llhabela, nos seguintes locais: Bonete; Enchovas; Indaiauba; Castelhanos; Praia Vermelha; Praia Mansa; Figueira; Guanxumas; Saco de Eustáquio; Saco do Sombrio; Ilha de Búzios; Guanchumas de Búzios; Porto do Meio; Pitangueiras; Mãe Joana e Ilha de Vitória. Nessas comunidades vivem cerca de 1 mil e 540 moradores.
Os únicos acessos a essas comunidades são por mar ou por terra, através de trilhas que só podem ser percorridas à pé. A distância mínima dessas comunidades ao centro urbano é de 30 quilômetros, durando, o percurso por mar, cerca de 2 horas e, por terra, 4 horas.
Em São Sebastião existe uma comunidade isolada na Ilha do Montão de Trigo, composta por cerca de 120 pessoas. O acesso a ela só pode ser feito por mar, através de barco, em viagens que duram, no mínimo, 3 horas.
Em Ubatuba, ficam localizadas as comunidades do Saco das Bananas e Camburi, que agregam cerca de 240 pessoas. O acesso a essas comunidades é feito por meio de uma trilha de 4 quilômetros de distância da Rodovia Rio-Santos, que em dias de chuva é impossível de ser percorrida. (Cf. informações obtidas através do site : www.litoralvirtual.com.br(12/08/04)
A maioria dessas comunidades vive ainda conforme o modo de vida antigo, de forma comunitária, da pesca artesanal, da agricultura de subsistência e da pequena criação de animais. O artesanato, a comercialização dos excedentes de pescados bem como as atividades de guia turístico constituem algumas das poucas formas de interação com o mercado e com a sociedade urbana. As prefeituras locais têm instalado alguns equipamentos e serviços públicos para dar atendimento básico a essas comunidades. Contudo a grande maioria não dispõe de energia elétrica e poucos moradores conhecem televisão, rádio, geladeira, telefone, fogão a gás e outros confortos da "sociedade civilizada”.

Um aspecto que tem preocupado as autoridades responsáveis pela proteção das áreas naturais no litoral Norte é a presença dessas comunidades e do seu modo antigo de vida, baseado na pesca, caça e extrativismo, no interior das Unidades de Conservação, embora muitos estudiosos e ambientalistas considerem que sua presença contribui para a preservação da biodiversidade e os caiçaras argumentem que estavam ali muito antes do governo e da lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação -SNUC.

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