terça-feira, 20 de março de 2012

ESPECIAL UBATUBA , ESPAÇO , MEMÓRIA E CULTURA...PAGINA 69



Uma vez recuperado Nóbrega selou o acordo de paz junto com Aimberé e as autoridades portuguesas. Iniciou-se uma expedição libertadora acompanhada de soldados que foi de fazenda em fazenda, de engenho em engenho para libertar os índios que sofriam do cativeiro dos portugueses. Aimberé fazendo parte da comitiva chegou por último na fazenda de José Adorno que estava sob a administração de Eliodoro Eoban. Não havia ninguém no casarão, uma atmosfera cheia de suspense e de mistério deixou o chefe da Confederação dos Tamoio em desespero por não encontrar ali Iguaçu, a mulher de sua vida.









 De volta a Iperoig, Aimberé percebeu que Anchieta se encontrava muito bem entrosado, catequizando e ensinando os ofícios aos habitantes da aldeia, ensinamentos de agricultura, pecuária, alimentação e saúde; ganhando o respeito de toda a taba de Coaquira.Com a chegada do chefe índio, Anchieta foi escoltado até São Vicente pelo jovem Cunhambebe e o líder dos Tamoio retorna à sua aldeia no Rio de Janeiro, fazendo um balanço positivo de sua gestão de paz, em favor do seu povo. A festa que o aguardava era para celebrar o regresso de Iguaçu que tinha sido resgatada por seus amigos, capturando os seus raptores, a família de Eliodoro Eoban. O chefe supremo da Confederação dos Tamoio ordenou que soltassem os cativos em respeito do seu acordo com os portugueses. Um breve tempo de paz veio após a assinatura do tratado de Iperoig. Os índios tornaram-se mais exigentes na troca de produtos que faziam com os franceses, dando início a um novo processo de importações e exportações: receberam teares e gados que ajudaram no progresso econômico das aldeias. Os portugueses romperam o acordo de pacificação que durou pouco mais de um ano, sujeitando ao trabalho escravo os índios. A guerra começou justamente onde tinha terminado, em Iperoig coma invasão dos das duas aldeias de Coaquira, morto o velho guerreiro, levaram os sobreviventes ao cativeiro. Depois acabaram com os redutos de Araraí também morto na devastação. Brás Cuba agora escravizava não só em função de suas fazendas e engenhos, mas também para expedições de garimpagem de ouro nos sertões. Os interesses de José de Anchieta mudam no decorrer do tempo, conforme as próprias políticas circunstanciais da Coroa, principalmente a respeito daquilo que seria o patrimônio territorial, incluindo nesse sentido os índios, radicalmente contra a dominação lusitana. Men de Sá, governador do Brasil que veio da Bahia para reforçar seu sobrinho Estácio de Sá, ao comando das operações de extermínio dos confederados, convencido de liquidar o poder dos Tamoio em favor da Coroa, o padre da companhia de Jesus, cuja missão era a evangelização e pacificação dos índios, adoçou a situação dramática de Rio de Janeiro, insuflando o governador geral sobre a carnificina de portugueses e, na hora do acerto de contas, assumiu o lugar de soldado, lutando no campo de batalha. Esta imagem de apóstolo das cruzadas contrasta com a visão de Celso Vieira, autor já citado que o coloca como um arauto da paz de Iperoig. A esquadra de Men de Sá chegou à Bahia de Guanabara o dia 8 de janeiro de 1567, com 3 galeões vindos de Lisboa, 2 navios de guerra bem armados. Diante de tal poderio, Aimberé intuiu a derrota inevitável e facilitou as coisas para os franceses e aliados que se mantinham fieis aos propósitos originais da Confederação. O sacerdote soldado sonha com São Sebastião, o padroeiro do Rio – “o mata índios”, assim como Santiago “mata mouros”. Após o fatídico 19 e 20 de janeiro de 1567, os portugueses dão fim a essa cruzada, celebrando o triunfo com as louvações do jesuíta. Anteriormente, José de Anchieta e Manuel da Nóbrega tinham sido convocados pelo Governador Geral da Bahia, para negociar com os rebeldes Tamoio, um Tratado de Paz no cenário de Iperoig. Os Tamoio não cederam a essa quebra do tratado. Men de Sá entra com todo o poder de fogo e Anchieta toma partido contra os índios que em outro momento foram “os filhos da terra”.



  Capítulo III A CONSTRUÇÃO DE UMA CULTURA NA SERRA DO MAR



 A construção de uma cultura se dá no cerne de uma sociedade e o meio para alcançar este desafio do tempo é a memória. A memória fala das raízes, daquilo que nos liga às coisas e aos lugares, à natureza e à cidade. Recuperar o vigor do tempo devolve ao espaço o esplendor, a força e o sentido. Assim, nos interessa como já pontuamos no início desta obra, desenvolver uma fenomenologia do espaço imaginário - contido na memória viva da comunidade local - que se une à consciência atual dos habitantes de Ubatuba, cidade situada na serra do mar. O imaginário é, construído e expresso por meio de símbolos. Desta forma, a imagem de Ubatuba se constitui em representação de uma idéia mental traduzida em imagens, palavras ou conceitos de uma realidade exterior. A experiência de percepção do espaço ubatubense nos fez passear pelos atrativos naturais e culturais que fazem desta cidade um destino turístico, mas a verdadeira redescoberta baseia-se no valor da memória Tupinambá inscrita na terra dos Tamoios, cativeiro de Nóbrega e Anchieta e o lugar de Paz da outrora Iperoig. Ação e representação estão ligadas ao imaginário cultural de Ubatuba, apesar da carência de registros escritos, a memória caiçara tem um papel preponderante na hora de reconstruir os alicerces desta cultura litorânea tão importante para a história do Brasil. Eclea Bosi, no seu livro, Memória e Sociedade (2001), cita Henri Bergson: “O corpo, interposto entre objetos que agem sobre ele e os que ele influencia, não é mais que condutor, encarregado de recolher os movimentos e de transmiti-los, quando não os detém, a certos mecanismos motores, determinados se a ação é reflexa, escolhidos se a ação é voluntária” (Bergson, 1959 apud Bosi, 2001:45). A autora nos oferece uma reflexão relevante do ponto de vista da produção de conhecimento, parafraseando Bergson, diz que a percepção dispõe do espaço na exata proporção em que a ação dispõe do tempo. Este talvez seja o paradigma que justifica nosso último capítulo. O corpo neste contexto tem dupla significação, refere-se ao corpo material e objetivo do indivíduo, assim como também ao corpo imaginário e subjetivo encarnado em uma sociedade. Toda história depende – como diz Paul Thomson – de sua finalidade social (Thomson, 1998:20). Por esta razão, a transmissão cobrava um papel importante e era feita de geração em geração, pela tradição oral ou pela crônica escrita como mencionamos na introdução ao capítulo da antropologia cultural. A função social da história de uma comunidade como Ubatuba compromete mais do que o conhecimento, o reconhecimento do potencial cultural da região. Por meio da história local, a cidade de Ubatuba pode buscar um sentido para sua própria natureza turística ou pesqueira, promovendo mudanças e fazendo com que turistas e visitantes possam adquirir uma percepção das raízes através do conhecimento da cultura local. O interesse em reconstruir a memória social de Ubatuba, no decorrer de sua vida cívica, nas representações da mídia, na voz dos “filhos da terra” e na daqueles que, de uma ou outra forma, fixaram seu olhar sobre a cidade, constitui um desafio à pesquisa e à produção de conhecimento. Para tanto, nos empenhamos em compilar dados históricos em fontes primárias, documentos oficiais que colocam Ubatuba no cenário nacional brasileiro. Indagamos sobre os meios de comunicação social e a imagem que estes veiculam, usando a cidade como cenário de obras televisivas e cinematográficas, assim como também sondamos o desenvolvimento da imprensa e rádio local. Mas, o momento crucial serão as entrevistas feitas a historiadores, artistas, velhos, mulheres , negros e caiçaras que neste livro têm a última palavra, pela força da paixão revelada no relato de suas histórias e estórias de Ubatuba.


Confira a sequencia deste especial no dia 26 de março, com a 70 º Parte, com publicação da sequencia da pagina  225

Nenhum comentário: