sábado, 8 de outubro de 2011

UBATUBA 1952.....ANJOS DA SAÚDE....

Continuação da fala do Joanito
Na cidade colheram 400 amostras: 399 deu positivo e somente uma negativa. Refizemos o exame e deu negativo novamente. Aí descobrimos que esta amostra pertencia à filha de uma professora sanitarista, transferida há poucos dias da capital para cá, exatamente para se integrar a equipe no combate a terrível epidemia que assolava Ubatuba, atingindo principalmente as crianças mais desnutridas, levando a óbito.





Ministramos a “panvermina”, a tempo e hora na cidade, e recomendamos ainda que antes do primeiro efeito, ao amanhecer, tomasse um laxante de sal amargo (salamargo), e seguimos para a Vila de Picinguaba.
Lá na Picinguaba o serviço foi mais demorado. Iniciamos às 9 horas da manhã. A desinformação era total, e ainda por ser o vermífugo cápsulas gelatinosas não podia ser deixado nas casas, então formamos uma enorme fila na praia e ministramos o remédio. Tapávamos os narizes das crianças que sem respiração abriam as bocas e aí eram despejados goelas abaixo as cápsulas gelatinosas cor de café fraco, de cheiro forte e horrível de se engolir (só quem tomou sabe o que eu estou dizendo). Eu tomei. Os caiçaras já tinham apelidado o vermífugo de ovo de “gonguito” (pequeno bagre do mar). Foi ministrado um laxante para ser tomado ao amanhecer do dia seguinte. Regressamos e chegamos à cidade só à noite do dia seguinte, e relatamos o fato ao médico.

Dr. Antonio Abdalla nos ordenou que voltássemos imediatamente à Picinguaba, porque os efeitos colaterais do vermífugo, aqui na cidade, eram devastadores provocando vômito, tontura e cólicas, e lá, isolados, não podiam ficar sem assistência médica. Chegamos lá no fim da tarde, mas quando o barco foi se aproximando da praia foi um quadro triste e engraçado ao mesmo tempo: era só gente deitada, criançada fazendo cocô ao longo da pequena praia, nos quintais, lombrigas (bichas) espalhadas por todos os lados. Gaviões, patos, galinhas, marrecos, faziam a festa, e as gaivotas, em revoadas, cada uma com uma bicha no bico, como se fosse um panaguaiú (peixe agulha). Nos quintais e na praia, foi uma cagança só! Permanecemos lá um dia e meio, orientamos sobre os cuidados que deveriam ter quanto à alimentação durante cinco dias de recuperação. Tudo foi controlado, nenhum óbito.
Os “Anjos da Saúde” percorriam as residências da zona central da cidade, a pé e de bicicleta. Nas escolas, a presença era obrigatória, nas praias e nos sertões, iam a cavalo, barco ou canoa a remo. Enfrentavam chuva e vento numa cruzada implacável ao combate contra a verminose que, por volta de meados de 1952, assolava não só Ubatuba, mas todo o resto do litoral norte paulista, inclusive o litoral catarinense e paranaense.
João Teixeira Leite (Joanito), o único funcionário daquela época que ainda está vivo, com quase 90 anos, está aí por testemunho.
O “Anjos da Saúde” eram os verdadeiros guardiões da saúde de Ubatuba naquela época. O resto é conversa mole.
[Clique aqui para acessar a listagem dos textos (já publicados) da série Construindo o passado IV - Anjos da saúde.]

Nota do Editor: Francisco Velloso Neto, é nativo de Ubatuba. E, seus ancestrais datam desde a fundação da cidade. Publicado no Almanak da Provícia de São Paulo para o ano de 1873. Envie e-mail parathecaliforniakid61@hotmail.com.




fonte : www.ubaweb.com

Nenhum comentário: