Seguindo viagem de volta, os Tupinambá fizeram mais uma parada para acampar, agora mais próximos de sua terra. Hans Staden tentou em uma conversa persuadir Cunhambebe para evitar que aqueles prisioneiros fossem mortos e devorados. O grande chefe retrucou dizendo que, efetivamente, eles seriam comidos. Quando chegaram nas terras próximas da aldeia, os Tupinambá dividiram-se entre si os prisioneiros. Os prisioneiros da aldeia com os quais Hans Staden estava, eram oito. Dentro das cabanas foram guardadas as carnes assadas dos cristãos, enquanto preparava-se a bebida para a grande festa que pretendiam fazer. No dia seguinte, os índios continuaram a devorar as carnes assadas dos cristãos capturados em combate.
De acordo com os registros de Hans Staden, fica evidente a devoção do artilheiro alemão. Muitas vezes, talvez por coincidência ou, pela força da fé que o movia, sua vontade de viver. Hans Staden conseguiu convencer os índios, deixando-os admirados, fazendo com que estes acreditassem em um poder sobrenatural ou em uma espécie de proteção divina.
Este aspecto religioso que mobilizou Hans Staden no decorrer de sua aventura entre os Tupinambá fica em evidência em alguns episódios por ele mesmo relatados. O que sabemos por fontes primárias de cronistas da época é que Hans Staden chorava copiosamente de medo no início de seu cativeiro. As lágrimas provavelmente despertaram entre os índios, mais do que compaixão, certa rejeição que foi paulatinamente sendo substituída por essa admiração pelo espírito religioso que o salvava nos momentos mais difíceis de sua convivência entre estes guerreiros antropófagos.
Hans Staden costumava todos os dias rezar frente a uma cruz de madeira feita por ele. Um dia quando o alemão havia ido pescar juntamente com os selvagens, uma mulher retirou-a do lugar dando-a para seu marido, este a usaria como socador de conchas. O alemão ao voltar da pesca e perceber que não estava mais a cruz no lugar, ficou muito triste e desgostoso. Foram seguidos muitos dias de chuva na região e os selvagens recorreram ao alemão para que pedisse ao seu Deus o cessar das chuvas, pois já estavam em época de plantio.
Hans Staden, aproveitando-se deste fenômeno meteorológico, jogou a culpa sobre os selvagens pelas chuvas torrenciais dizendo que seu Deus estava bravo pela retirada da cruz de seu local. Os Tupinambá, acreditando novamente no poder de intervenção do alemão junto a seu Poderoso protetor, na mesma hora, construiu uma nova cruz, e como em um passe de mágica, ou melhor, em um verdadeiro milagre, as nuvens se foram e o belo astro rei voltou a brilhar.
Novamente, dias depois, em uma pescaria, o alemão e mais dois selvagens foram surpreendidos por uma tempestade de chuva que se aproximava da embarcação. Imediatamente, os índios parecendo já ter a certeza e acreditar que o Deus de Hans Staden fazia o que ele queria, pediram para que este intercedesse junto a Ele, podendo assim ter sucesso na pescaria e suprindo a falta de comida na aldeia. Comovido pelas palavras dos selvagens, o alemão suplicou a Deus, sabendo que assim reforçaria de vez esse poder. Terminado a sua oração divina, a chuva acompanhada de um forte vento, veio a poucos metros deles, permanecendo seco o local onde estavam. Um dos selvagens comentou: “Agora vejo que você falou com o teu Deus”. Este fato foi comentado por toda a aldeia, deixando a todos admirados.
No decorrer dos dias, os Tupinambá pretendiam realizar um festim na última noite do alemão na aldeia, pois no dia seguinte ele seria dado de presente a uma outra aldeia vizinha. Restavam três mamelucos cristãos vivos dos que foram capturados em combate anterior. Eram os irmãos Diogo e Domingos e mais outro chamado Antonio que juntamente com Hans Staden foram obrigados a beber e a ver os selvagens comerem pedaços assado de um outro cristão que já havia sido morto anteriormente. Restaram aos quatros orar e pedir a Deus misericórdia por aquela pobre alma que outrora habitara aqueles pedaços de carnes assadas que iriam ser devoradas. Ao despedir-se dos três prisioneiros, no dia seguinte, o alemão orientou-os a fugir quando fosse possível, utilizando-se da serra como caminho, onde seria difícil para os selvagens segui-los e assim o fizeram, conseguindo escapar. Já o alemão, partiu com destino a uma outra aldeia, Taguaraçu-tiba, sendo entregue ao chefe de nome Abati-poçanga. Recomendações a este novo dono do alemão foram feitas: como de não maltratá-lo, pois seu Deus era terrível contra aqueles que lhe faziam mal; e que em breve amigos e irmãos do mesmo chegariam com muitas mercadorias para serem trocadas por ele. Com estas recomendações o chefe Abati-poçanga o escolheu como seu convidado participando juntamente com seus outros filhos na caça e na pesca.
O alemão Hans Staden permanecia naquela nova aldeia, já há 14 dias quando ouviram tiros que vinham da direção do porto de Niterói, Rio de Janeiro. Eram os franceses que sabendo que Hans Staden estava mandou dois de seus melhores homens e já vivo entre os selvagens que o tinham capturado. Enviaram à aldeia dois homens que ao olharem o alemão, mal podiam acreditar no estado miserável em que se encontrava.
Hans Staden, cheio de felicidade os cumprimentou na língua dos Tupinambá. Os franceses, com muita pena, entregaram-lhe nas mãos umas roupas, dizendo-lhe que estavam ali para buscá-lo e assim levá-lo a bordo do navio. Hans pediu a um deles que dissesse ao chefe dos selvagens que era seu irmão e que muitos caixotes de mercadorias estavam no navio para a negociação da troca. Finalmente Hans Staden recuperou sua liberdade depois de cinco dias e muita conversa. O alemão deixava para trás uma parte de sua vida que jamais esqueceria, tanto que proporcionaram ao alemão os primeiros registros escritos e ilustrações sobre o Brasil e seus habitantes.
Assim, o alemão e artilheiro Hans Staden,cativo dos Tupinambá os descreve::
São gente bonita de corpo e estatura, homens e mulheres, igualmente (...) apenas, são queimados do sol, pois andam todos nus, moços e velhos... (Hans Staden, 1554)
Nos registros finais de sua aventura deixa gravado o seguinte louvor a Deus:
Assim, Deus todo poderoso, Deus de Abraão, Isaac e Jacó, ajudou a me livrar do poder desses horríveis e cruéis selvagens. Seja Ele louvado, enaltecido e honrado na pessoa de Jesus Cristo, seu filho querido, nosso salvador. Amém.
(Ibidem)
Hans Staden partiu daquele local, no navio francês Catherine de Vatteville, cujo capitão chamava-se Guilherme de Moner. Ainda, no porto do Rio de Janeiro, o alemão teria sua vida posta em risco em uma batalha contra um navio português, levando alguns franceses a morte e outros feridos, entre eles o próprio Hans Staden que ficou em estado grave. Mais uma vez, seu divino protetor, livrou-o da morte atendendo as suas suplicas, assim recuperou-se rapidamente, comprometendo com isto sua eterna gratidão.
No final do mês de Outubro do ano de 1554, Hans Staden partiu em viagem de volta à França. Dependendo dos fortes ventos, a embarcação soçobrou entre uma grande calmaria, daí a mediação de Hans Staden veio a propiciar, por obra divina, o vento tão almejado. Içaram-se as velas e um forte sopro deslizou o navio pelo mar conduzido segundo o alemão pela força de Deus. No dia 20 de fevereiro do ano de 1555, os tripulantes da embarcação chegaram à pequena cidade francesa de Honfleur.
O livro que orientou a pesquisa sobre as aventuras do alemão foi publicado pela Editora Terceiro Nome Hans Staden – Primeiros registros escritos e ilustrados sobre o Brasil e seus habitantes (1999), tradução de Angel Bojadsen. Nele, os relatos, desenhos e as xilogravuras, foram feitos com uma descrição primorosa do próprio Hans Staden. Uma tradução de documentos de grande importância para uma compreensão fundamental da formação do Brasil que despertou grande interesse em todo o mundo sendo publicado em vários idiomas.
Um fato interessante aconteceu na publicação de uma edição no ano de 1557. Numa nova tiragem - pirateada -, pela pressa e sem os devidos cuidados, os desenhos que acompanhavam o texto, em vez dos indígenas nus, apresentavam árabes tão vestidos que sequer dava para ver os rostos.
Tanto os registros escritos de Hans Staden sobre suas reais e verídicas aventuras entre os Tupinambá, quanto os desenhos das xilogravuras originais, causam até os dias de hoje grande admiração nos leitores.
Estes registros guardam detalhes e passagens descritas pelo alemão, capazes de atiçar o imaginário de cada um daqueles que os lê. Baseado nesses relatos o cinema , o veiculo capaz de reproduzir os grandes mitos da humanidade ,retratou na grande tela parte desta aventura. O filme baseado no livro anteriormente mencionado foi produzido no ano de 2001, tendo como cenário, maravilhosas paisagens da mata atlântica, na atual cidade de Ubatuba.
TERMINA AQUI A MINI - SÉRIE " A VERDADIRA HISTORIA DE HANS STADEN E UBATUBA...............
TODA A MINI SERIE AQUI PUBLICADA, FOI EXTARIDA DO LIVRO " UBATUBA , ESPAÇO MEMÓRIA E CULTURA - ED. 2005 - Com autorização pessoal de um dos autores, no caso Jorge Otavio Fonseca .
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