sábado, 30 de abril de 2011

MINI SERIE : A VERDADEIRA HISTORIA DE HANS STADEN E UBATUBA - 4 ª PARTE

Aproximando-se de cada enfermo, Hans Staden fez imposição de mãos sobre suas cabeças como o exigia o ritual das curas. Mas, morreram um a um; primeiro, uma criança depois a mãe do chefe, e dias velha, um irmão do chefe e outra criança. O pai da família com medo da iminência da morte pediu, novamente ao alemão para que seu Deus parasse com a ira e o deixasse a ele e a sua mulher viver. O alemão o acalmou dizendo que não haveria perigo, mas que quando sarasse nenhum mal deveria lhe acontecer. Na hora, o chefe ordenou a todos que não o denegrissem e nem o ameaçassem. Dias depois, Nhaêpepô-oaçu e sua mulher, recuperaram-se.




Na aldeia encontravam-se mais dois chefes de aldeias vizinhas . Eles compartilhavam uma série de experiências, um deles havia sonhado com o alemão que teria anunciado sua morte. Tanto um como outro chefe estavam preocupados e sofrendo com os pesadelos, e diziam ao alemão que não lhe fariam mal e não o comeriam. Até as mulheres idosas que o haviam feito sofrer proferindo golpes, arrancando-lhe os cabelos, os pêlos e ameaçando-o em comê-lo passaram a chamá-lo de Chê-raira, quer dizer: “meu filho”, pedindo a este que não os deixasse morrer.

Cada vez mais indecisos em relação a nacionalidade do prisioneiro os selvagens decidiram poupá-lo por mais um tempo.

Caruatá–uára, o francês que tinha aconselhado os selvagens a comê-lo, voltou à aldeia de Ubatuba. Achava que Hans Staden já havia sido morto pelos selvagens. Encontrou-o dentro da cabana e na língua dos selvagens perguntou se ainda estava vivo. Staden respondeu: “Sim, e agradeço a Deus por ter-me protegido durante tanto tempo”. Como já tinha a liberdade de se locomover sem as amarras, procurou um lugar longe dos selvagens e assim poder conversar com o francês. Explicou todo o ocorrido na segunda viagem ao Brasil, que esteve entre os portugueses, pois tinha naufragado com os espanhóis nas proximidades de São Vicente. Pediu ao francês que contasse aos índios que ele era seu amigo e parente, e também que o levasse aos navios franceses que aportariam em breve ali perto em busca de especiarias.

O francês parecia arrependido de não tê-lo ajudado, portanto resolveu ajudá-lo desta vez, dizendo aos selvagens que se havia confundido e que Hans Staden era um alemão, amigo dos franceses. Mesmo assim, os Tupinambá só o deixariam partir, se o pai ou irmãos do alemão viessem com navios e trouxessem presentes como facas, tesouras, machados e outras mercadorias. O francês prometeu ao alemão que voltaria num outro navio com as mercadorias para atender ao pedido dos selvagens.

Algum tempo depois, os selvagens já com boa saúde, resolveram ir a uma aldeia chamada Tiocoaripe para comer um prisioneiro que pertencia à tribo dos Maracajá, amigos dos Tupiniquim, levando Hans Staden junto. Fariam uma festa, regada de cauim e logo depois, matariam o infeliz. Hans Staden conseguiu chegar até o prisioneiro na noite anterior ao dia da festa, conversou com ele por um tempo explicando que também era um prisioneiro dos Tupinambá e que não estava ali para come-lo. Tentou passar uma mensagem de paz ao espírito do cativo, afirmando que Deus o receberia em um lugar onde todos viviam sem diferenças, provocando resignação ante a iminência da morte.

Nesta mesma noite um forte vento soprou e os selvagens pensaram que o alemão havia pedido ao seu Deus para que não matassem e comessem esse prisioneiro com o qual havia estabelecido amizade e que era tão amigo dele como dos Tupiniquim. Hans Staden rogou a Deus pedindo que continuasse a protegê-lo daqueles selvagens, pois, entre eles voltavam a sussurrar a seu respeito. Ao amanhecer, o alemão foi até o escravo e disse que aquele forte vento da noite era Deus e que o levaria a presença Dele. No outro dia, depois de muita festa e cauim, enfim, os Tupinambá mataram e devoraram o prisioneiro da tribo Maracajá.

Ao voltarem para a aldeia de Ubatuba, chovia muito e a viagem se prolongou por três dias. No caminho, enquanto os selvagens devoravam a carne assada do escravo, Hans Staden observava com atenção um jovem que devorava um osso da perna O alemão pediu –lhe que o jogasse fora, pois não havia mais carne, e o jovem respondeu irado que era o costume deles comer com deleite carne humana. Depois que chegaram da demorada viagem, um dos dois senhores de Hans Staden, o Alkindar, perguntou-lhe se havia visto como tratam seus inimigos, este respondeu indignado que sim. Alkindar odiava Hans Staden, mas nada podia fazer contra ele, pois o havia dado ao Ipiru-guaçu respeitando uma das mais velhas tradições Tupinambá. Mesmo assim o alemão vivia sob a ameaça deste selvagem.

O cativo alemão , sempre amparado pela Providência divina, segundo suas próprias palavras, atendeu a este mesmo selvagem que o ameaçava quando precisou de sua ajuda para se curar de fortes dores nos olhos. Novamente, Hans prometeu ajudá-lo, com condição que este parasse de ameaçá-lo. O Alkindar acatou seu pedido e alguns dias depois estava curado. Isso fortaleceu ainda mais a idéia dos selvagens a respeito da relação do alemão com seu Deus que intervinha todo o tempo a seu favor.

Os portugueses costumavam comercializar com os Tupinambá, apesar da rivalidade e inimizade. Trocavam facas e foices pela farinha de mandioca que usavam para alimentar seus escravos negros que mantinham nas plantações de cana-de-açúcar. A maioria das vezes a comercialização acontecia num navio português que ancorava próximo da praia, até onde os índios chegavam de canoa. Dois selvagens subiam para efetivar a troca de mercadorias enquanto eram observados à distância por outros selvagens com intuito de garantir a negociação. Mas, em numerosas ocasiões os selvagens reagiam insatisfeitos lançando flechas contra àqueles injustos comerciantes.

Já haviam passado cinco meses da permanência de Hans Staden entre os selvagens. Uma navegação de portugueses vinda de São Vicente aportou próximo da aldeia de Ubatuba, Angra dos Reis. Um tiro de canhão chamou a atenção dos selvagens que correram à praia, pois, achavam que se tratava de um navio trazendo mercadorias. Os portugueses perguntaram logo pelo alemão, se ainda este estava vivo, dizendo que queriam vê-lo. Tinham uma grande caixa, cheia de mercadorias mandada pelo “irmão” de Hans Staden, que também se encontrava a bordo do recém chegado navio1. Era, na verdade um francês, um velho camarada do alemão chamado Claude Mirande.

Os selvagens voltaram à aldeia, disseram ao alemão que seu irmão estava no navio e que queria vê-lo. Hans Staden fez os selvagens acreditarem que aquele francês era efetivamente seu irmão convencendo-os que o levassem até ele. Uma vez a bordo, Hans Staden conversou com um dos portugueses e lhe solicitou que o tratasse como francês. Um outro tripulante do navio de nome Juan Sánchez, conhecido do alemão, contou que tinham viajado com o propósito de achá-lo. O capitão Braz Cubas tinha ordenado que descobrissem se ele ainda estava vivo e o levassem de volta, mesmo que fosse preciso capturar alguns selvagens para depois negociá-lo numa troca.
1 A palavra irmão entre aspas faz referência na verdade a um velho camarada francês de Hans Staden. Cabe salientar aqui que germano, isto é, alemão, também se traduz como irmão no sentido mais literal e cristão do termo.


FONTE  :  LIVRO UBATUBA, ESPAÇO , MEMORIA E CULTURA - ED. 2005

CONFIRA A 5 ª PARTE   DESTA MINI SERIE   A  SER PUBLICADA NO DIA :

05/05/2011

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