segunda-feira, 21 de março de 2011

GRANDES UBATUBENSES......Maria e Fidencio somam 2 séculos de história pra contar

Maria e Fidencio




“Amar pra ser amado” foi assim, baseando-se nesta frase que foram criados junto com os familiares e amigos. Único casal vivo que guarda os reais segredos da aparição da santa Nossa Senhora das Graças no Morro do São Cruzeiro no Sertão da Quina, seu Fidencio e tia Maria possuem juntos 202 anos de vida e muita história pra contar. 






Ele nasceu Fidencio Manoel de Oliveira em 16 de novembro de 1907 na Praia da Fortaleza. Ela Maria Gaspar dos Santos nascida em 29 de junho de 1912 no Sertão da Maranduba (S. da Quina), filha de Messias Manoel Gaspar dos Santos e Antonia de Amorim, neta de Manoel Gaspar dos Santos e Rosa Félix Gaspar de Jesus, um dos casais que fundaram a região. Ele, filho do segundo casamento de Manoel Zacarias e Maria Bernardina de Santana, seus irmãos são: João Zacarias, Valdevino, Sebastiana, Benedita e Maria Conceição. O casal teve os filhos: José, Zacarias, Braz, Fidencio, Pedro, Sebastião, Maria Conceição, Maria de Oliveira e Manoel Fidencio. Todos criados com muito sacrifício mais com muito amor para dar e distribuir. Maria foi até “ama” de leite de vários meninos, hoje alguns são avós.

Casaram no dia de todas as almas e todos os santos- 31 de novembro de 1928, isso mesmo possuem 82 anos de casamento. Seu Fidencio relata que ganhou de presente de casamento 1.500 pés de café, 1.000 pés de laranja e dois alqueires de mandioca “pra capiná”. Os noivos e convidados foram um dia antes a cidade para o casório, levaram quatro horas e meia a pé. Lá fizeram um pouso para casar na parte da manha para dar tempo de chegar em casa casado e fazer a primeira refeição como marido e mulher literalmente a luz de velas (fifó-lamparina). Na chegada tiveram de atravessar o Rio Grande (Maranduba) sobre um tronco talhado que servia de ponte. Os homens carregavam as mulheres no colo para não se molharem. Fidencio cavalheiro como era foi atravessar com a Ana Correia e como o tronco estava molhado os dois caíram na água e o agora marido molhou o terno branco que vestia.

Ele trabalhou na prefeitura com o prefeito Cel. Ernesto de Oliveira, sua função era ascender e apagar o pavio das lamparinas da rede publica de iluminação no centro da cidade. Trabalhou ainda na Santa Casa e na fazenda Jundiaquara. Depois trabalhou na Fazenda dos Ingleses na Vila de Santo Antonio (Caraguatatuba). Lá jogou futebol na posição de ponta esquerda, aprendeu Kung Fu e Box, era 1925. Ela quando menina participou de todas as visitas da Imaculada a este território. Foi peça fundamental na montagem do único documentário em vídeo sobre a historia da aparição. Muitos outros depoimentos não foram publicados por solicitação de Maria.

Ela é dona de uma musica que aprendeu em sonho, foi por indicação da Virgem, também de uma oração para rosário que só existe aqui em todo o planeta. Quando fala sobre o tema, lagrimas correm em seu lindo rosto, percebe-se que é pela descrença e perda do respeito sobre o tema e também pela felicidade que a aguarda. Suas orações e cantos saem de sua boca como se não fosse ela que esta dizendo. Sai como doce e como canto de pássaro.

Ela ainda recorda das grandes roças na Pedra Preta, de mandioca brava para farinha, café, banana, dos feijões de corda como a fava, rama doce para acompanhar o café e da Mulaé, segundo moradores a rama de mandioca mais antiga do Brasil, espécie que foi trazida pelos negros escravos. Maria é da Irmandade Sagrado Coração de Jesus e da Legião de Maria, devoção deixada a pedido da Imaculada em 1915-17, a qual não participa por conta das condições físicas, mas todos sabem que participa na fé, que é inabalável. “É tanta pouca-vergonha hoje em dia, que se soubessem o que os aguarda pediriam perdão a Virgem”, desabafa Maria.

Perguntado o que eles aguardam a resposta foi curta: “DEUS”. Quando casaram as únicas coisas que compravam era a querosene, sal, “fórfi” (fósforo), sapato e fazendas de panos. Fidencio trabalhava com as tamancas (calçado) de madeira, algumas eram produzidas em Ubatuba na antiga Fazenda Usina Velha. As mais chiques eram trazidas de Portugal, umas abertas e outras fechadas. A fazenda Usina Velha tinha trazido do Porto de São Sebastião do Rio de Janeiro um automóvel que era a fascinação de todos. Um dia um pneu furou e o estepe tinha de esperar chegar de Portugal, mais um carpinteiro muito bom de Ubatuba providenciou uma roda completa de madeira, a fama do carpinteiro cresceu ainda mais. Muita gente passava pelo carreiro desta fazenda para ouvir o ronco do motor do “automóver”.

Ele ainda tem a replica de legítima Henrique Laporte, cartucheira de 1925 com peças de vidro calibre 40. Sempre simples o casal é hoje Patrimônio da região. Quando Fidencio nasceu o Sertão da Quina tinha pouco mais de setenta anos de vida. Chegou a ver muitos escravos bisavós dos remanescentes quilombolas da Ubatuba atual. Seus detalhes impressionam. Ao conhecer a vida deles e de tantos outros descobrimos que mesmo com a vida dura a região era linda e as pessoas não eram tão gananciosas como hoje, que a nossa vida é cheia de frescura, com o dizia minha avó. Tratavam-se pessoas puras, mesmo com o inicio da especulação imobiliária e a tomada das terras, como bem relata o livro Ubatuba Terra e População da Mestra Maria Luiza Marcilia.

Ao ver a paz que buscam neste tempo e o silencio mostram a sabedoria que cabe a nós tirar o chapéu e agradecer a Deus pelo privilégio e a honra de të-los como testemunhas oculares da história e da formação de nosso país. Principalmente a mim que ouviu, sentiu, abraçou, falou com Fidencio e Maria. Ao pedir a benção a este casal parece-me que pedi a todos que um dia conheci e partiram, num coro imagino ouvir o “Deus Te Abençoe, Te Guarde e Te Proteja Meu Filho”. Confesso que não tem dinheiro que pague esta sensação, uma das prazerosas que vivenciei.
 

EZEQUIEL DOS SANTOS
www.maranduba.com.br

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