sexta-feira, 30 de abril de 2010

UBATUBA 2009 : Homenagem ACIU - Artistas plásticos Bigode, Jacó e Da Motta

Da Motta (de pé) Bigode (à esq.) Jacó (à dir.)


Por Celso Teixeira Leite-------Da Motta: fusão da escultura com a pintura......“Saúde e paz” são as primeiras palavras ao cumprimentar amigos e conhecidos. Transmite uma tranqüilidade de quem já esteve em muitos lugares desta vida e, aos 75 anos, diz que estas são duas palavras fortes que resumem tudo o que o homem precisa. José Vicente Doria da Motta Macedo, casado com Izabel e pai de Sergio, Antonio Augusto, Lavinia, Daniel, Maria Lucia e Paulo, com 20 netos e 14 bisnetos é um artista plástico que conseguiu fundir a vocação de escultor com a de pintor resultando em obras de arte que ganharam projeção internacional. De sua oficina no Perequê-Açu, freqüentada por rolinhas que não se intimidam com a presença de estranhos e permanecem ciscando, são produzidas pinturas no entalhe encomendadas por clientes de todo o Brasil e do exterior.

Chegou em Ubatuba em 1967, teve uma convivência muito estreita com a escritora Idalina Graça, de quem foi hóspede, sua mãe espiritual e avó de seus filhos. “Provocou em mim uma evolução mental permitindo o encontro comigo mesmo”, diz

Freqüentou curso com Collete Pujol, pintora de grande prestígio premiada pela Associação Paulista de Belas Artes e recebeu convite do prefeito Ciccilo Matarazzo para montar o museu pedagógico de Ubatuba. Define-se como um neo-acadêmico, mais folclorista do que religioso. As estátuas de santos estão espalhadas pelas igrejas da Ilha Anchieta (Bom Jesus), São Francisco (Ipiranguinha), São Pedro Pescador (Matriz), Santa Isabel (Ubatumirim). Sua produção é eclética e não tem idéia do número de entalhes e esculturas que já entregou, pois atende encomendas que vão desde paisagens simples da vida caiçara até santos chineses. Marca presença em Ubatuba há mais de 43 anos com sua arte exportada para Rússia, Alemanha, Itália, Canadá, Estados Unidos e Argentina, além de muitas regiões do Brasil. Defende a manutenção da nossa história e a preservação das origens na roça e não só do centro da cidade. Sua avaliação do mundo:

“Nasci católico, freqüentei umbanda e cultos evangélicos, agora sou um terráqueo. Aprendi a conhecer o ser humano, resume Da Motta.


Jacob: a arte de mil maneiras


A dificuldade para conversar é grande, daí seu desespero. Imita instrumentos, lembra dobrados e outro gêneros, além de batidas na mesa para se comunicar, mas não desiste de contar sua história. A doença cobrou seu preço. Jacob, 75 anos, mais conhecido pela sua obra como artesão é na verdade um fanático por música desde a infância. “ Sou um misto de escultor, músico e poeta”, diz.

Morador do Perequê-Açu desde que chegou em Ubatuba na década de 60 , tem 4 filhos ( Luiz, José, Denise e Cláudio), 8 netos e 2 bisnetos, tornou-se um artista da terra ao registrar costumes locais, o índio e o caiçara . Defensor ardoroso da natureza utilizou a madeira e suas formas, cores e desenhos para compor uma figura real ou abstrata. Tem um carinho especial pela figura de “ A caiçara”, uma escultura que se olhada de lado é uma mulher e de outro um homem . O preto velho e o cachimbo, um robô de um metro de altura, o cachorro bassê de maçaneta e o pernilongo fazem parte de uma segunda fase da produção marcada pelo aproveitamento de sucata. Algumas das peças ainda estão em seu poder, mas a maioria acha-se exposta em residências dos Estados Unidos, Portugal, Japão ou Itália. A falta de reconhecimento pelo seu artesanato nos últimos anos levou Jacó a optar pela marcenaria pois não concordava em fazer qualquer coisa só para sobreviver.

Natural de Embu das Artes, aos 8 anos já expunha na Praça da República e ajudava o pai na mercearia com o aproveitamento das tábuas das caixas de madeira para consertar móveis. Daí surgiram os pedidos para andores e esplendores do Divino e para mobiliar casas inteiras. Sua paixão pela música o acompanha desde cedo e foi passada para os filhos. Recentemente deu uma flauta japonesa para um dos netos.” Fiz parte da Banda de Embu e toquei sob a regência do maestro Antenor Carlos Vaz “, afirma com orgulho.

Sua vida de cigano fez com que morasse em Gonçalves, MG e Campos de Jordão e expor sua arte em Santos, Guaratinguetá e Taubaté, para finalmente, se fixar em Ubatuba. Foi um dos defensores do autêntico artesanato caiçara participando da montagem da Feira de Arte e Artesanato, montada em 1971 na Praça Nóbrega mais tarde transferida para a Praia do Cruzeiro e da criação da Casa do Artista, na avenida Iperoig, que despertou muita polêmica com os comerciantes locais.

João Teixeira Leite, pintor primitivista, lembra do episódio do Boi Natureza que desfilou no carnaval de 1983: “ Jacob pegou na praia um tronco de madeira parecido com um boi, adaptou um tonel que encheu de vinho, colocou as rodinhas e entrou na avenida para alegria dos foliões que tinham bebida de graça. E ainda teve a marchinha para animar a festa”, diz .

O armazém de secos e molhados do Jacob na av. Padre Manoel da Nóbrega, no Perequê-Açu, além de servir a famosa caninha “Ubatubana” produzida pelos Irmãos Chieus, era a oficina onde o visitante podia também conhecer o mais legítimo e criativo artesanato caiçara.


Bigode: o humilde e sua arte fantástica


Suas mãos não permitem mais esculpir e colocar na madeira a idéia que vai à cabeça. O glaucoma e o reumatismo não deixam, mas o cérebro continua ativo e a passar instruções aos filhos de como lidar com a madeira, a escolha, o corte, a conservação e o instrumento de trabalho. Só não consegue repassar seu dom divino: a arteEm uma casa humilde, no Perequê-Açu, mora Antonio Theodoro da Silva, mais conhecido como mestre Bigode, com sua Joana com quem teve 20 filhos, dos quais 14 vivos, 43 netos e um bisneto. O burburinho na casa é permanente e na hora do almoço o cheiro forte de sardinha frita invade o ambiente. Um cenário tipicamente caiçara.

Aos 76 anos, o artesão Bigode é uma das referências mais fortes de Ubatuba com milhares de trabalhos que vão de uma minúscula figa ou de São Francisco, do tamanho de um palito de fósforo, até a estátua da Igreja da Imaculada Conceição, no Perequê-Açu, com mais de 1,70 m. Teve bronquite aos 13 anos que foi curada pulando 9 ondas, se enrolando na areia quente da praia para depois cair na água fria do mar novamente. Receita dos antigos que deu certo, diz Bigode. A doença o impediu de freqüentar a escola e, até hoje, não sabe ler nem escrever. Despertou cedo para a arte do entalhe e os pedaços de guairana, urucana, caixeta e cedro viravam bodoques, piões, revolveres,máscaras de carnaval e, mais tarde com a bronca do pai, mudou para canoas , santos e rabecas ajudando no sustento da família.Durante 20 anos participou da Corrida de São Silvestre chegando em 34º lugar em 1972 competindo pelo E.C.Itaguá. Era presença obrigatória nas corridas da cidade. O ambiente católico de sua formação foi responsável pela maioria dos trabalhos. Cita com orgulho a escultura do rosto de Jesus Cristo exposta no Vaticano e os 4 santos na Igreja do Pilar, em Taubaté ( São José, Santo Antonio, São Francisco e São Jorge). Alguns dos filhos trabalham com a parte do acabamento de suas obras ou fabricação de móveis rústicos.Seu realismo fantástico ganha de histórias de pescador e divertem. São situações absurdas inventadas na hora, na certa uma prática herdada do tempo das assombrações. Fala da bicicleta grávida que comprou no Rui e pariu duas bicicletinhas; a briga com o lobisomem quando foi obrigado a segura-lo pelas duas orelhas; do mosquito da dengue com 1 m de altura encontrado no Itamambuca e do caso do revólver de ouro que jogou no mar e foi engolido por uma garoupa, até hoje procurada pelos pescadores da barra.O trabalho de Bigode como escultor é uma das principais referências da história do nosso artesanato e motivo de orgulho da comunidade caiçara.

(Fonte: ACIU)

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