quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

AUTOBIOGRAFIAS DE UBATUBANOS E DE UBATUBENSES E O SILENCIAMENTO DA CULTURA

AUTOBIOgRAFIAS DE UBATUBANOS E DE



UBATUBENSES E O SILENCIAMENTO DA CULTURA


CAIÇARA: UMA ANÁLISE DISCURSIVA DOS TEXTOS


DE ALUNOS DA EJA -  1 ª PARTE



Por Luciana Aparecida de Mesquita


Ubatuba é uma cidade do litoral norte paulista que fica no meio da BR-101,

estrada que liga São Paulo ao Rio de Janeiro. Houve um tempo em que essa extensa

cidade era habitada, em sua maior parte, por caiçaras, agricultores e exímios pescadores

que moravam à beira-mar e tiravam seu sustento do mar e da terra, a qual eles mesmos

cultivavam.

Antes da década de cinqüenta do século passado, quando começou a abertura da

estrada Caraguatatuba-Ubatuba, a antiga SP-55, conhecida hoje, como Rodovia dos

Tamoios, e ainda mais em meados da década de setenta, com a abertura BR-101,

rodovia translitorânea que liga o extremo norte ao extremo sul do país e passa pela

cidade de Ubatuba, esse povo tinha a cultura baseada em crenças religiosas, respeito à

natureza e ao próximo e solidariedade. Esses costumes eram expressos por meio da

linguagem, da música, das rezas e também pelo artesanato voltado para a pesca, pela

preparação da farinha de mandioca e pela confecção de alguns utensílios domésticos.

Seus costumes eram transmitidos oralmente, de pai para filhos, e a narração era muito

rica.

Com o crescimento e com a especulação imobiliária local, a cidade que antes era

uma vila de pescadores tornou-se uma estância turística, e seu povo de origem foi

praticamente deslocado de seu espaço, em virtude de a praia ter se tornado

comercialmente valorizada. Com isso, a conversa à beira-mar, durante a feitura das

redes de pesca ou ao chegar das pescarias, durante as rezas ou ao anoitecer, quando era

costume dos mais velhos contarem histórias de pescaria, de valores morais, ou cantarem

para filhos e netos, foi paulatinamente se extinguindo. Essa cultura oral foi se perdendo

à medida que outras pessoas foram chegando com outras culturas que foram se

incorporando à língua e à cultura local, assim como o recente advento tecnológico.

Hoje, Ubatuba conta, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística), em 2007, com 77.008 milhões de habitantes. Considerável parcela desses é

oriunda de diferentes cidades e traz consigo diversas culturas e linguagens próprias de

várias regiões ou até mesmo de outros países.

A cultura caiçara popular traz consigo valores como o respeito, a amizade, a

tolerância, a religiosidade e a harmonia, que fazem parte da memória cultural desse

povo. Cada palavra mostra muitos valores agregados, e é importante descobrir, dentro

de cada pessoa, os valores que podem se tornar esquecidos por conseqüência do desuso

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imposto pelo novo tempo e somá-los àqueles que são comuns nos tempos atuais. Para

Diegues (2004, p. 22), a cultura caiçara é definida como

um conjunto de valores, visões de mundo, práticas cognitivas e

símbolos compartidos, que orientam os indivíduos em suas relações

com a natureza e com os outros membros da sociedade e que se

expressam também em produtos materiais (tipo moradia, embarcação,

instrumentos de trabalho) e não materiais (linguagem, música, dança,

rituais religiosos).

Indo além do saudosismo, e, somando-se os fatos de não fazerem o uso da

escrita e de gerarem o conhecimento por meio da oralidade, de um linguajar próprio;

terem conhecimento dos ciclos naturais e dependerem deles para sua sobrevivência,

assim como viverem em comunidades familiares e utilizarem técnicas de baixo impacto

sobre a natureza, os caiçaras podem ser definidos como “tradicionais”.

A tradição caiçara é entendida como

um conjunto de valores, de visões de mundo e simbologias, de

tecnologias patrimoniais, de relações sociais marcadas pela

reciprocidade, de saberes associados ao tempo da natureza, músicas,

de saberes associados ao tempo da natureza, músicas e danças

associadas à periodicidade das atividades de terra e de mar, de

ligações afetivas fortes com o sítio e a praia. Essa tradição, herdada

dos antepassados, é constantemente reatualizada e transmitida às

novas gerações pela oralidade. É por meio da tradição que são usadas

as categorias de tempo e espaço e é por meio dessas últimas que são

interpretados os fenômenos naturais (DIEGUES, 2004, p. 22-23).

É possível observar exemplos dessa tradição e dos valores culturais caiçaras em

depoimentos de ubatubanos, colhidos por Rassam (2007, p.32), como o de seu Bimbim,

de 85 anos, pescador da praia do Ubatumirim, segundo o qual,

se com uma pessoa assim, podia ser seu irmão, a gente se tava com

chapéu na cabeça ... tirava, dava a mão para “bença”, hoje tem isso?

Hoje o mundo mudou muito[...] de primeiro não, “nóis” aqui só

trabalhava. Não tinha esse negócio de brigalhada. Quando tinha festa,

roda de chiba – um cateretê aí era de “ocê” “mostra” o que sabia

“fazê” (RASSAM, p. 32)


CONTINUA : 30-/01/2010


Fonte : http://www.unitau.br/cursos/pos-graduacao/mestrado/linguistica-aplicada/dissertacoes-2/dissertacoes-2008/2006-2008%20MESQUITA%20Luciana%20Aparecida%20de.pdf







FONTE :>

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