quarta-feira, 8 de outubro de 2008

CANINHA UBATUBA : Remédio Falso



Rotulo da Caninha Ubatubana

Texto de :
Eduardo Antonio de Souza Netto
articulista@ubaweb.com


Lembrei-me, outro dia, de meu amigo Hélio Stefani. Na verdade, sempre estou me lembrando desse amigo que se foi há algum tempo e deixou muita saudade. Nasceu em São Paulo, casou-se e veio morar em Ubatuba, onde lhe nasceram os filhos. No começo, abriu um escritório de contabilidade onde exerceu por um bom tempo sua profissão de contador. Bem mais velho do que eu, tinha, à primeira vista, uma cara ranzinza que, se a conversa lhe agradasse, após alguns minutos, logo era desfeita para dar lugar a um sorriso gostoso de bonachão. Todavia, quando perdia a esportiva, sai de baixo! O homem avermelhava, ficava rabugento, resmungava, rosnava e espalhava perdigotos nos arredores. Era dose! Gordinho, fumante inveterado e, como eu, torcedor do Palmeiras e chegados numa boa cachacinha.


Quando nos conhecemos, eu era muito jovem e exercia o mandato de vereador. Ele trabalhava na secretaria da Câmara Municipal. Mesmo tendo sido eleito vereador pela ARENA, minhas convicções políticas eram meio de esquerda e camufladas. Os tempos exigiam... O partido era apenas acessório, circunstancial, como são até hoje os partidos. Já o Hélio era o que se chama hoje em dia um neo-liberal. Uma vez quebramos o pau por causa do Roberto Campos de quem defendia as idéias que rotineiramente lia no Estadão. Divergíamos radicalmente quanto à política, mas sintonizávamo-nos quando o assunto era Ubatuba, literatura, cinema etc.


Lembro-me de que um dia contou-me que era fã de carteirinha da Rita Hayworth e que, quando adolescente, tinha ereções no cinema quando a via. Eu tive uma, na verdade, naquela época era o que mais se tinha, quando vi a Ursula Andress saindo do mar de biquíni, naquele filme do James Bond.


Pois bem, uma vez, como era de praxe, fomos ao Bar do Franklin tomar uma Ubatubana. Esta foi a melhor cachaça já produzida e um marco na história desta cidade. Quando batia na goela, ardia um pouco, depois descia gostosa, com aquele cheirinho de canavial. Um néctar dos deuses! Tanto da branca, quanto da amarelinha. Esta, a mais difícil de encontrar no mercado, a não ser que se comprasse direto na Fazenda Velha, da família Chiéus, onde era fabricada. O Hélio era metido a expert em bebidas. Olhamos para a prateleira revestida com espelhos que ficava por detrás do balcão e vimos uma garrafa de Ubatubana com o rótulo já meio puído indicando ser de uma boa e velha safra. Imediatamente o meu finado amigo pediu ao Quilim que botasse uma dose para cada um. Foi aí que, na primeira golada que o Hélio deu, aconteceu o desastre! Mal bateu na garganta, a cachaça foi expelida acompanhada de um acesso de tosse, cusparadas no chão do bar e de imprecações. - Isso nunca foi Ubatubana!!! - protestou, com os olhos lacrimejantes e a cara vermelha feito um camarão. Saí do bar com o meu amigo inconformado com o Quilim que teria colocado outra marca de pinga na velha garrafa de Ubatubana.


Foi a primeira experiência marcante que tive de um consumidor ludibriado, pelo menos convencido de ter sido, já que, de minha parte, não creio que o Quilim tivesse feito tal sacanagem. O Hélio, naquele dia, não tava era com boca boa para degustar. Fico imaginando-o, se estivesse entre nós, assistindo todo esse escândalo de falsificações de remédios que todos os dias tem saído nos noticiários. Não creio que iria deixar de crer no capitalismo, nas tais leis de mercado; mas que ia praguejar, lá isso ia!


FONTE :

http://www.ubaweb.com/ubaweb/n11/11_art2.html

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